Baseado em best-seller controverso que foi parar na Justiça, filme na Netflix vai chocar moralistas Divulgação / Ent One

Baseado em best-seller controverso que foi parar na Justiça, filme na Netflix vai chocar moralistas

Há algum tempo, a Polônia descobriu um jeito de exorcizar fantasmas de outros tempos e amenizar o peso de governos que, ironicamente, tentam com todo o empenho reproduzir a atmosfera de terror de quase oito décadas atrás: dotar seu cinema de tanta lubricidade quanto puder. Essa sede por liberdade em todas as suas diversas naturezas tornou-se parte do jeito polonês de viver desde pelo menos o advento da superliga das pequenas nações da Europa Oriental num só bloco, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), encabeçada pela muito poderosa Rússia, que vigorou de 1922 a 1991 fomentando divisões e conflitos econômico-ideológicos invisíveis para o resto do mundo e tirando deles toda a vantagem que pudesse.

Era no silêncio das alcovas que se dava a revolução possível, expediente que a Polônia digeriu e absorveu como fundamental para sua autoafirmação, lenta e idiossincrásica, e “O Preço do Prazer”, na Netflix, o demonstra com riqueza de detalhes. A história de uma modalidade bastante peculiar de prostituição e tráfico de mulheres investigada pelo jornalista PiotrKrysiak em “Girls from Dubai” (“garotas de Dubai”, em tradução literal), publicado em 2018, vira um thriller erótico nas mãos hábeis de Maria Sadowska, que dota seu filme de cenas de sexo que sugerem muito mais que mostram e sempre acha espaço para cutucar uma ferida nacional que teima em permanecer aberta. O roteiro de Lucas Coleman, Mitja Okorn e Peter Pasykcontorna o drama íntimo de jovens mulheres polonesas em busca de sucesso e fortuna em meados dos anos 1990 para mergulhar no esfacelamento moral de uma geração inteira, falsamente seduzida por promessas de uma felicidade instantânea.

O tempo corre, mas essas esperanças de plenitude se esboroam no primeiro vendaval mais forte — e isso não parece ser nunca tristeza para ninguém. Reconhecemos nossas fraquezas, mas nem sempre conseguimos nos livrar do que nos debilita, e nisso a experiência nem sempre ajuda.Amores podem ser como perfumes, que evolam sem que se perceba, embora sempre deixem seu rastro de olores ora adocicados,  ora cítricos, quase azedos; como cores, luminosas feito o sol numa tarde de verão, ou tão lúgubres e escuras que tingem de morte o que deveria sembrar apenas o existir mesmo. A fotografia de Arthur Reinhart dá a impressão de que há glamour demais no que Sadowska quer contar, ou mesmo na pena severa de Krysiak.

A verdade é que Emi, a jovem sonhadora interpretada por Paulina Galazka, quer deixar Estetino, na voivodia da Pomerânia Ocidental, de qualquer jeito, mas esbarra em tipos como Dorota e Marianna, mãe e filha com o DNA da malandragem pulsante. Katarzyna Figura e Katarzyna Sawczuk dão um ar de chanchada a um enredo que, do contrário, poderia restar austero demais, recurso estilístico certeiro num longa de quase invencíveis 140 minutos.


Filme: O Preço do Prazer
Direção: Maria Sadowska
Ano: 2021
Gêneros: Thriller/Drama/Erótico
Nota: 8/10