Dirigida por filho de Gabriel García Márquez, pequena obra-prima da Netflix é um dos filmes mais belos do ano Divulgação / Netflix

Dirigida por filho de Gabriel García Márquez, pequena obra-prima da Netflix é um dos filmes mais belos do ano

Rodrigo García é um diretor colombiano cheio de bons trabalhos. Seu reconhecimento vai além do fato de ele ser filho do lendário escritor Gabriel García Márquez. O talento de Rodrigo é seu mérito.  Diretor de episódios de séries importantes, como “Família Soprano”, “Carnivale”, “A Sete Palmos” e “Big Love”, ele também é o nome por trás de “Albert Nobbs”, filme que rendeu indicação ao Oscar para Glenn Close. Ele também escreveu roteiro do aclamado “Destinos Ligados”. Rodrigo, ainda, foi indicado ao Emmy. Mas em “Família” ele faz algo diferente do usual. Aqui, ele dirige seu primeiro filme em sua língua materna, o espanhol. Com roteiro escrito em colaboração com a dramaturga Barbara Colio, o longa-metragem é baseado em uma relação familiar cheia de contrastes e histórias.

Aliás, assim são todas as famílias, não é mesmo? Há uma complexidade, uma idiossincrasia e uma cultura tão particulares e cheias de linguagens que só seus integrantes são capazes de reconhecer. Todas as famílias são assim, mas elas não são todas iguais. Elas são tão únicas, que o olhar que depositamos sobre esse filme precisa ser sincero e sensível. É uma comunicação muito estreita entre a vida comum e o cinema.

Se esta tradução de Rodrigo é tão profunda e, ao mesmo tempo, tão trivial, talvez seu talento seja mesmo herdado de seu pai, alguém que conseguia transcrever para a literatura a vida em seu estado mais essencial, mais puro. Esse tipo de expressão deveria ser fácil, mas a realidade é que é a forma mais difícil de fazer arte. Essa capacidade de traduzir sentimentos e emoções tão profundos que nem nós mesmos conseguimos nomear ou identificar.

Em “Família” acompanhamos um dia do clã do patriarca Leo (Daniel Giménez Cacho), dono de um rancho de olivas, localizado em Baja California, no México. Ele está cansado de mantê-la sozinho, enquanto vive de suas colheitas quase sempre ruins, das quais produz seus distintos azeites e azeitonas. Ele reúne as filhas, o genro, a nova nora, a namorada e os netos para apresentar uma proposta que recebeu. Uma empresa transnacional fez uma oferta valiosa pelo rancho familiar e ele tem intenções de vendê-lo, mas não o fará a menos que a decisão seja corroborada por todos os integrantes da família. Em uma mesa rústica de madeira posta no terreiro, um longo diálogo se estende no decorrer da tarde. Durante a discussão, dissecam memórias, rancores, amor, preconceitos. Enquanto a dinâmica familiar se desenrola, há tanto com o que nos relacionamos. As famílias trazem consigo tanto amor, mas também muitas dores.

Na família há gerações, o rancho e a possibilidade de perdê-lo desperta nostalgia e melancolia. O adeus será eterno, caso o acordo seja selado. Todos aqueles momentos marcantes ficarão enterrados no passado. Quando é hora de seguir em frente? Ao mesmo tempo, o peso de todo o trabalho é carregado por Leo, que sozinho mantém o lugar e sua colheita. Os filhos não querem saber do lugar, a menos que seja apenas como recanto de descanso, casa de campo para os feriados. A vida já aconteceu lá, agora é nas cidades. O lugar ficou preso ao passado e não se adequa mais às necessidades dos filhos e netos de Leo.

“Família” é tocante, doloroso e íntimo. Embora seja ficção, é como remexer feridas.


Filme: Família
Direção: Rodrigo García
Ano: 2023
Gênero: Drama
Nota: 10