Crônicas

Não me espere para o jantar. Fui gostar de quem gosta de mim e não volto tão cedo!

Não me espere para o jantar. Fui gostar de quem gosta de mim e não volto tão cedo!

Dei o fora de repente. Sem aviso prévio, sem fazer as malas. Saí como quem vai comprar cigarro e não volta mais. Tantas vezes a gente avisa que vai embora, ameaça, faz chantagem, mas por medo da solidão não consegue ir. Falta coragem. Prorrogamos a dor da despedida e a agonia que nos assalta só de pensar na abstinência do outro. Aceitamos menos amor, menos atenção, menos carinho, menos tesão, menos cuidado. A gente aceita ser menos, ou quase nada. Até que uma hora a gente cansa. E bate a porta sem dar uma palavra.

É possível passar por uma vida inteira e morrer sem enxergar de verdade

É possível passar por uma vida inteira e morrer sem enxergar de verdade

Aprendi a ver de verdade enquanto olhava para um relógio, esperando consulta médica que ficava cada vez mais distante. Até aquele dia, só olhava, sem nada ver direito. Flagrei o momento exato em que o ponteiro começou a dançar frenético de um lado para outro. Ele ia e voltava entre o décimo sexto e o décimo sétimo segundo de um minuto, aprisionado naquela impertinência de quem não se sabe medíocre. Comecei a caçambar os joelhos entre uma perna e outra da cadeira, com agonia pelo relógio e pela demora.

Espalhe sorrisos. No mínimo, você salvará o dia de alguém

Espalhe sorrisos. No mínimo, você salvará o dia de alguém

Outro dia, numa sessão de cinema lotada, enquanto estava na fila para comprar pipoca junto às outras pessoas que também esperavam, a mulher à minha frente começou a gritar com o atendente do balcão. Ela estava histérica e reclamava sobre a demora no atendimento. Quando chegou a minha vez, aproximei-me do balcão e percebi que o atendente, um moço jovem, tinha ficado chateado. Ele trabalhava sem parar. Anotava os pedidos, pegava pipocas e refrigerantes, recebia o pagamento e devolvia o troco. Senti pena dele. Senti pena daquela mulher. Senti pena de todos nós.

Aos 20 você sabe de tudo. Aos 30, começa a ter dúvidas. Aos 40 você quer voltar a ter 20

Aos 20 você sabe de tudo. Aos 30, começa a ter dúvidas. Aos 40 você quer voltar a ter 20

Há muitas razões para alguém, beirando os 40, querer mudar o curso do barco. Nessa fase da vida se supõe estar no meio da travessia, por isso a incerteza do rumo, do vento, do destino, da companhia a bordo. “Metade do caminho. Quantas coisas já deixei pelas margens do meu caminho. Coisas inteiras e pela metade. Ou quantas metades já teve o meu caminho. Ou quantos caminhos percorri de metade em metade.” Carlos Trigueiro, em “Memórias da Liberdade”, fez o que o homem ocidental faz quando chega no meio do destino. Pôs na balança a própria vida.

Lista das mulheres que não merecem ser estupradas

Lista das mulheres que não merecem ser estupradas

A mamãe. Você que me lê. As analfabetas. As cegas de paixão. As eleitoras do Bolsonaro. As mamíferas. As revolucionárias. As belas recatadas do lar. As moradoras de rua. As muito cultas que se amarram em filmes noir. As celibatárias. As que possuem um aleijão. As Portadoras de Necessidades Comuns, como ser feliz, por exemplo. As presidentes. As que foram chamadas de anta. As que rodam a bolsinha. As que aplicam as economias no mercado financeiro. As que se casaram só por dinheiro. As solteironas. As batizadas. As ateias. As plebeias.