Último dia para assistir, na Netflix, ao filme com Emma Thompson e Anthony Hopkins, que foi indicado a 8 Oscars Divulgação / Columbia Pictures

Último dia para assistir, na Netflix, ao filme com Emma Thompson e Anthony Hopkins, que foi indicado a 8 Oscars

Embora oscile entre extremos emocionais, a trajetória de Stevens, o mordomo retratado por Anthony Hopkins em “Vestígios do Dia”, reflete uma extensão de um sofrimento latente. Essa colaboração entre Hopkins e James Ivory, enriquecida pela participação crescente de Emma Thompson, se destaca como uma adaptação notável do livro “Os Vestígios do Dia” de Kazuo Ishiguro, laureado com o Prêmio Man Booker em 1989.

O filme destila uma narrativa que, embora possa parecer carente de um ritmo definido, na verdade, trilha um caminho onde a essência do personagem principal é explorada com uma delicadeza que borra as linhas entre o revelado e o oculto, em um ciclo de eventos que por vezes parece reiterativo. Aos poucos, a presença de Stevens se torna cada vez mais central, uma conquista não só atribuída à habilidade excepcional de Hopkins mas também ao impacto gradual de Thompson, que traz uma mistura harmoniosa de carisma e melancolia à tela.

O trabalho de Ruth Prawer Jhabvala no roteiro estima de maneira eficaz a influência dominante de Stevens na primeira parte da história. Como mordomo-chefe da propriedade Darlington Hall, uma magnífica residência campestre na Inglaterra, ele serve um aristocrata em declínio, Lord Darlington, interpretado por James Fox. A venda da propriedade a um político americano adiciona um peso de vergonha ao personagem de Fox, enredando Stevens em um contexto de serviço leal misturado com o medo de desemprego, uma amargura que permeia sua existência e uma solidão da qual parece inseparável. A cinematografia de Tony Pierce-Roberts capta habilmente a beleza da paisagem inglesa, contrastando-a com a jornada de Stevens ao litoral para reencontrar a senhorita Kenton, interpretada por Thompson, não por um gesto de gentileza, mas por um desejo de trazê-la de volta ao serviço em Darlington Hall, revelando sua obsessão e egocentrismo.

O romance original de Ishiguro aborda de forma mais fluida a controvérsia em torno da simpatia de Lord Darlington pelo regime nazista, evitando os exageros dramáticos utilizados no filme para enfatizar essa temática. A história central, no entanto, gira em torno do relacionamento não realizado entre Stevens e Kenton, com momentos de desconforto do mordomo durante eventos sociais grandiosos sendo particularmente reveladores, mesmo que sua posição pessoal permaneça ambígua. A atuação de Thompson ganha mais destaque após esses momentos, introduzindo uma dinâmica que infelizmente não atinge seu potencial pleno, apesar dos esforços combinados de Thompson, Hopkins e Ivory.

O contraste com o calor emotivo de “Me Chame pelo Seu Nome” (2017), outro sucesso de Ivory, é palpável, transformando a energia da história em um retrato mais frio e formal da servidão inglesa. A performance de Thompson como Miss Kenton desafia essa rigidez com uma entrega que beira o melodrama sem jamais perder o controle, um testemunho do seu talento excepcional. O final, marcado pela escolha de Stevens, ressoa com uma tristeza particular, especialmente diante da demonstração de um amor não correspondido por parte de Kenton, um sentimento que se destaca como um lembrete pungente da complexidade das escolhas humanas e das emoções não expressas, tão vivas quanto uma tarde ensolarada no campo inglês.


Filme: Vestígios do Dia
Direção: James Ivory
Ano: 1993
Gêneros: Romance/Drama
Nota: 9/10