A joia escondida da Netflix que vai te assegurar 100 minutos de mistério e diversão Divulgação / Woods Entertainment

A joia escondida da Netflix que vai te assegurar 100 minutos de mistério e diversão

Abe Applebaum vem daquele mundo encantado onde crianças passam anos fazendo coisas maravilhosas, proferindo absurdos hilariantes, hipotecando religiosamente aos adultos sua ração da mais cândida fantasia, pondo na mesa de marmanjos anabolizados e mulheres demasiado pintadas suas oferendas para um futuro mais auspicioso, até que… crescem. “Um Caso de Detetive”, a fábula de Evan Morgan sobre ex-garotos-prodígio caídos em desgraça só porque não puderam vencer aquele que determina o ritmo do mundo, diz obviedades que soam como pérolas e elabora graves reflexões acerca de temas indigestos de forma a sacudir as certezas que muitos de nós ainda temos, mesmo depois da vida lançar-nos ao rosto a manifesta verdade de que existir é reinventar-se sempre.

Morgan fixa-se num protagonista melancólico, trágico, dado a impulsos autodestrutivos, um legítimo fracassado, que se acorrenta a uma infância gloriosa, mas devidamente mantida na sua época adequada. Empregando um mote confessamente inverossímil, o roteiro do diretor perambula com Abe por todas as bibocas onde costuma se enfiar, dando a partida em algum instante congelado de que ele mesmo talvez não se lembre mais, quiçá por causa do trauma que essa experiência lhe causou.

Uma cidadezinha com o sugestivo nome de Willowbrook fora assolada por crimes bastante sui generis há pouco mais de duas décadas. A tal Gangue do Sapato Vermelho espalhou terror entre a população; uma certa cápsula do tempo foi roubada; fundos de uma escola sumiram. Todos esses casos (e mais duas centenas) foram resolvidos, quem diria, por Abe, à época uma criança, que não tardou a ganhar status de celebridade entre seus concidadãos, com direito a seu próprio escritório no centro e guloseimas por conta da Hepburn’s, a loja de doces local.

O detetive mirim ia muito bem, até que um crime inesperado escandaliza Willowbrook e arruína a vida do jovem candidato a messias. Antes de começar a dizer exatamente o que de fato se passou, Morgan expõe em quase todas as sórdidas minudências a debacle de seu anti-herói, morando numa república asquerosa aos 32 anos, dependendo da bondade dos pais, com Wendy Crewson e Jonathan Whittaker em participações diminutas, mas atiladas, para receber comida e saldar dívidas que pululam do cartão de crédito, tudo porque não conseguiu solucionar o desaparecimento de Gracie Gulliver, sua assistente e filha do prefeito.

Adam Brody fica a um passo da caricatura, mas é expedito o bastante em trazer seu personagem para o terreno do sensato — o quão sensato pode ser alguém como Abe. Como nem só de infortúnio ele vive, Caroline, a mocinha interpretada por Sophie Nélisse, acena-lhe com uma dupla possibilidade, de resgate e de amor desinteressado, até porque o natural seria ele aproximar-se dela, movido por razões bem outras que as do afeto.

Mediante os flashbacks em que Jesse Noah Gruman assume a pele do investigador, o enredo dá algumas pistas quanto à forma como o ex-detetive infantil vai conduzir seu novo trabalho depois de uma vida de descomposturas. Como já era de se esperar, ele dá cabo de seus dias de ostracismo com uma grande descoberta a respeito de Gracie, papel de Kaitlyn Chalmers-Rizzato, e da própria Caroline. Não importa quão simples um caso pareça: revelações sempre chocam.


Filme: Um Caso de Detetive
Direção: Evan Morgan
Ano: 2020
Gêneros: Mistério/Drama
Nota: 8/10