Ganhador do Oscar, uma das mais belas e emocionantes histórias de amor do cinema está na Netflix Divulgação / Sony Pictures

Ganhador do Oscar, uma das mais belas e emocionantes histórias de amor do cinema está na Netflix

Seria “Me Chame Pelo seu Nome” uma versão, igualmente centrada na temática gay, mas mais abastada, elitista de “Moonlight – Sob a Luz do Luar” (2016), vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2017 e de outras duas estatuetas? Ao analisarmos unicamente o enredo do filme dirigido pelo italiano Luca Guadagnino, baseado na novela de André Aciman, de origem ítalo-egípcia, a conclusão imediata que se apresenta é que “Moonlight” explorou uma gama muito mais ampla de temas complexos, independentemente do contexto, seja em um país extremamente rico e desigual (nos referimos aos Estados Unidos, onde se desenrola a história retratada por Barry Jenkins), ou em um cenário idílico que parece feito sob medida para deleite dos sentidos, como a região indeterminada onde Aciman situa sua narrativa – sabemos apenas que fica ao norte da Itália, particularmente ensolarada no verão, com pouca disparidade socioeconômica entre sua população nativa.

É importante acrescentar que a imigração, por motivos diversos, trouxe inúmeros imigrantes para toda a Europa, sem planejamento ou compensação financeira por parte de seus países de origem. No entanto, essa discussão mereceria um artigo separado e seria mais apropriada para a narrativa de “Moonlight”.

A Itália durante o verão se apresenta como o lugar perfeito para um jovem abastado em férias, mas, como é comum, descobertas raramente ocorrem sem conflitos. O professor universitário Perlman, um especialista em cultura greco-romana, recebe a visita de Oliver, um estudante encarregado de auxiliá-lo em sua pesquisa, interpretado por Armie Hammer. Oliver, belo, sensível e noivo de uma moça, imediatamente desperta o interesse de Elio, filho do professor Perlman, que fica instantaneamente e intensamente atraído pela figura quase divina do discípulo de seu pai. Ao espectador é sugerida a ideia de que Elio talvez tenha sido um homossexual reprimido durante toda a sua vida, por razões que desconhecemos, mas que, de fato, conhecemos muito bem.

Elio parece ter passado sua breve existência esperando por aquele momento, a revelação de Oliver diante de si, o cheiro de seus cabelos impregnando o ar, o calor do hálito do visitante encontrando o dele. Se Elio fosse mais jovem, talvez tivesse uma reação em forma de transe, tão intensa e incontrolável que ultrapassaria os limites da mente e se manifestaria em seu corpo. Isso se assemelha ao que acontece em retrospecto com Salvador Mallo, o protagonista de “Dor e Glória” (2019), interpretado na fase adulta por Antonio Banderas no filme de Pedro Almodóvar. A verdadeira controvérsia em torno do trabalho de Guadagnino não se deu com os críticos nem com o público, mas sim com aqueles prontos a se autoproclamarem juízes morais do mundo, incapazes de perceber suas próprias contradições.

Alega-se que Elio era menor de idade e teria sido alvo de um possível assédio por parte do professor Perlman, que teria usado Oliver como mero entretenimento, uma vítima do tédio. No entanto, essa interpretação se revela um delírio, uma forma de psicopatia ou inveja. Perlman é um homem sensível, culto e, acima de tudo, perspicaz, que há muito tempo já havia percebido a orientação sexual de seu filho, sem a necessidade de consultar ninguém, nem mesmo sua dedicada esposa e mãe atenciosa. Talvez tenha ocorrido ao mestre uma iluminação de outra natureza com relação ao filho. A chegada de Oliver serviu para confirmar o que Perlman já suspeitava sobre a visão de Elio em relação à vida e a si mesmo no mundo. O jovem loiro abalou as estruturas daquela família, sem derrubá-las, apenas removendo algumas pedras soltas e trazendo uma autenticidade e sinceridade ao ambiente.

O fato de a história se passar em 1983 não implica necessariamente na rejeição da família de Elio a Oliver, dado o ambiente de liberdade e sofisticação que prevalece. O principal enfoque aqui é o amadurecimento de Elio, com Timothée Chalamet moldando o enredo à sua maneira. Chalamet, ao longo de sua carreira com mais de duas dezenas de papéis no cinema, sempre se destacou não apenas pela sua beleza, mas também por sua interpretação impecável, que realça sua estampa aristocrática. No entanto, em “Me Chame Pelo seu Nome”, seu personagem assume um aspecto mais comum. Não é apropriado rotular o filme como gay, um drama queer ou qualquer outra nomenclatura semelhante. O que prevalece aqui é a suavidade, sem julgamentos nem neuroses, algo que, para variar, é revigorante.

Embora a narrativa possa parecer arrastada em alguns momentos, a beleza da história e das paisagens supera qualquer sensação de tédio, surpreendendo o espectador, que pode facilmente se ver cativado pela trama.

A Grécia Antiga foi provavelmente a única civilização na história da humanidade em que a relação entre dois homens não apenas era respeitada, mas também encorajada. Conscientemente ou não, o roteirista James Ivory baseou-se nesse conceito ao desenvolver o relacionamento entre Perlman e seu aluno. O professor não seria considerado insano se suspeitasse que Oliver estivesse abusando de sua hospitalidade, traindo a confiança que lhe fora dada. No entanto, Ivory, aos 89 anos, a pessoa mais idosa a ganhar um Oscar, optou por não insinuar tal possibilidade. Ele segue fielmente o que se encontra na obra de Aciman até o desfecho do filme, que é igualmente brilhante ao situar a história nos anos 1980. Embora essa década tenha sido menos libertária e mais conservadora do que as décadas de 1970 e 1960 que a precederam, ainda estava longe do auge da repressão conservadora que se consolidaria.


Filme: Me Chame Pelo seu Nome
Direção: Luca Guadagnino
Ano: 2017
Gênero: Romance/Drama
Nota: 9/10