Embora eu não tenha assistido ao primeiro filme de Paco Plaza sobre irmã Morte, “Verónica” (2017), sua espécie de preâmbulo para a história, o recém-lançado “Irmã Morte”, é um terror bem consistente e amarrado sobre a personagem que dá nome ao filme, uma noviça chamada Narcisa (Aria Bedmar). Considerada milagrosa durante a infância, Narcisa se muda para um convento quando jovem, onde é confrontada por um espírito ressentido.
A história se passa no pós-Guerra Civil Espanhola. O convento é um palácio medieval misterioso em um lugar ermo e cercado de bosques, onde meninas são educadas e oprimidas por um grupo idoso e fanático de mulheres religiosas. Países hispânicos exercem com maestria sua habilidade de contar histórias de terror de cunho religioso, provavelmente por sua cultura extremamente arraigada no cristianismo e cujos folclores e lendas acabam girando em torno dessas figuras eclesiásticas, que são bons nutrientes para essas tramas.
Em “Irmã Morte”, Narcisa é uma mulher empática, sensível e humilde. Após encontrar uma maleta com alguns pertences de uma falecida freira, ela começa a sentir forças sobrenaturais rondarem os cantos, corredores e paredes da fortaleza de pedra. Abalada com a presença que se esgueira onde quer que ela vá, Narcisa confessa ao padre que não sabe se está pronta para o que seja lá que a aguarda no convento. O padre diz que ela está perdida, mas a aconselha de forma simplista e superficial, como se quisesse dar o assunto por encerrado.
No entanto, sonhos e visões macabras começam a atormentar Narcisa, colocando sua sanidade em jogo. Quando duas alunas trazem à tona a lenda da “menina”, um suposto fantasma que assombra o convento, elas são reprimidas e punidas por Madre Superiora (Luisa Merelas) e irmã Júlia (Maru Valdivielso). Quando uma das garotas aparece morta, a culpa recai sobre Narcisa, que teria alimentado os rumores sobre o espírito vingativo ao dar credibilidade para as duas garotas.
Ao juntar suas malas e sair do castelo, Narcisa olha diretamente para um eclipse solar e queima seus olhos. A experiência física a permite transcender ao espiritual e retornar ao convento durante a invasão de soldados anos antes, que saquearam e vandalizaram o lugar, profanando o sagrado e violentando irmã Socorro, dona da maleta encontrada por Narcisa em seu quarto. Uma visão trágica revela um passado doloroso e que o convento tentou manter encoberto. No entanto, erros precisam ser reparados para livrar o lugar da terrível maldição que o ronda.
O enredo de Jorge Guerricaechevarría é requintado, sucinto e organizado, embora complexo e inteligente. Não há uma tentativa de florear a história ou criar firulas visuais para explicar o passado de irmã Socorro. Todas as pontas se amarram de forma precisa e modesta, alcançando um resultado narrativo envolvente e crível. A fotografia de Daniel Fernández Abelló é igualmente elegante e minimalista, brincando com chiaroscuro e priorizando paletas monocromáticas.
O terror cresce mais internamente no espectador que externamente, na tela. É algo que o filme vai semeando aos poucos na emoção do público. Não é necessário sustos, figuras demoníacas macabras ou outros efeitos com intuito de criar o pavor. Na verdade, o sentimento que mais provoca é angústia e tristeza. Conforme o mistério se desdobra, o filme nos fala sobre como a religião pode ser sustentada por hipocrisia, usada para restringir e oprimir mulheres e um antro de segredos obscuros e cruéis.
Filme: Irmã Morte
Direção: Paco Plaza
Ano: 2023
Gênero: Terror
Nota: 10