O filme na Netflix que todo amante de livros deveria assistir Aidan Monaghan / Capelight Pictures

O filme na Netflix que todo amante de livros deveria assistir

Os livros são como moradas para onde nossa alma se muda, buscando se ajustar a novas vidas que se desvelam diante de nossos olhos e corações. A leitura nos permite desfrutar de sonhos vívidos, revisitados uma e outra vez ao longo de nossas existências. Nos livros, vivemos através dos personagens, nos reconhecemos neles e permitimos que nos conheçam. “A Livraria”, um drama de Isabel Coixet, é uma ode à arte, à beleza, à humanidade e, é claro, à literatura – uma ferramenta poderosa que nos convence de que um caminho mais promissor e um futuro menos amargo são possíveis. O roteiro de Coixet, baseado no romance de Penelope Fitzgerald, nos leva em uma jornada pela vida de uma mulher que ousou enfrentar a estreiteza de mente de uma pequena cidade no sul da Inglaterra nos anos 1950, enfrentando uma adversidade maior do que poderia imaginar. O filme revela uma crítica sociocultural mais contundente na transição do segundo para o terceiro ato, enquanto a diretora-roteirista aprofunda-se na psicologia dos personagens, explorando o intrincado fluxo de consciência que torna difícil distinguir heróis de vilões.

Após terminar a jornada de leitura, quando esvaziamos nossa mente das emoções e ideias que os livros nos proporcionam, somos apresentados a uma mulher sentada à beira-mar, usando um agasalho verde e um lenço com estampa de pássaros na cabeça. Rapidamente percebemos que Florence Green é uma figura incomum em Market Hardborough, uma cidade repleta de habitantes dissimulados e mesquinhos. Desde o início, Florence enfrenta a resistência de seus conterrâneos, que não compartilham sua grande ambição. Ela escolheu se mudar para lá após a morte de seu marido na Segunda Guerra Mundial, um trauma que ela guarda com cuidado, protegendo suas memórias mais preciosas. O fato de tê-lo conhecido em uma livraria talvez seja o fio condutor da história, mas a sensibilidade da interpretação de Emily Mortimer revela a estética, a sabedoria e a coragem intrínsecas à protagonista. Ao comprar a Casa Velha, um imóvel cultuado devido à mentalidade reacionária dos habitantes locais, Florence assume um desafio que se revela mais complexo do que imaginava.

O conflito com Violet Gamart, interpretada por Patricia Clarkson, está longe de ser a principal preocupação de Florence, e este é o seu erro fatal. Violet Gamart dita as regras na cidade, movendo os fios invisíveis de uma engrenagem hermeticamente fechada. Mesmo o general aposentado, interpretado por Reg Wilson, é submisso às vontades de Violet. Por trás da fachada de megera, vestida com trajes de lamê dourado, batom vermelho e um cigarro cor-de-rosa, ela esconde sua calculadora natureza. Ela vai a Londres tentar persuadir seu sobrinho, um político influente na região, a aprovar uma lei que facilitaria a desapropriação de imóveis adquiridos após um certo período de tempo, incluindo a Casa Velha. O que se segue é uma implacável perseguição a Florence, incluindo tentativas de difamação baseadas em calúnias. Mesmo com a ajuda de Edmund Brundish, interpretado por Bill Nighy, um mecenas que se opõe a Violet Gamart, Florence não consegue vencer essa batalha.

A última cena, sombria e impactante, revela o grande segredo do filme: o arrependimento de Christine, a narradora, enquanto Franchesca McGill Perkins arruma livros nas prateleiras de uma loja. Nesse momento de “A Livraria”, a audiência percebe que meio século se passou, mas imediatamente recorda da menina que Christine foi, retratada por Honor Kneafsey, um reflexo da crueldade infantil explorada pelo escritor britânico Richard Hughes em “Vendaval em Jamaica”.


Filme: A Livraria
Direção: Isabel Coixet
Ano: 2017
Gênero: Drama
Nota: 9/10