4 filmes ganhadores do Oscar que você pode assistir na Netflix ou no Prime Video Allyson Riggs / A24

4 filmes ganhadores do Oscar que você pode assistir na Netflix ou no Prime Video

Entra ano, sai ano e a cerimônia de premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos, encerra na mesma proporção controvérsia, dor de cotovelo, charme e glória. Capturando as atenções do mundo desde 16 de maio de 1929 e dando início às transformações sociais que definem a própria natureza humana — quase todas graduais, lentas, todavia pouco metódicas, como se restasse uma margem bastante limitada para mudanças estruturais na quadra do tempo que nos compreende —, o Oscar continua a ser um termômetro do que anseiam povos do mundo todo quanto à inclusão das mulheres; às necessidades das gentes da periferia do globo; à preservação da natureza e das culturas regionais; à preservação da paz e à luta por igualdade; à urgência do sonho, puramente, vívido em manifestações artísticas como o cinema, a própria encarnação do melhor que o homem pode ser.

A cerimônia mais querida, mais odiada, mais falada e mais preterida do cinema mundial experimenta idas e vindas e é desses altos e baixos — mais precisamente nos baixos — que o Oscar tira a força para resistir por mais um ano. Esta foi uma safra feliz para a apreciação dos velhinhos rabugentos que compõem o corpo de jurados das centenas de produções avaliadas pela Academia a cada edição do Oscar, um espetáculo grandiloquente, milionário, ainda hoje apreciado por telespectadores de mais de duzentos países, sem contar quem acompanha a celebração pelas redes sociais e por plataformas como YouTube e Twitch. Escusado dizer que, a despeito de suas muitas más fases, o Oscar nunca deixou de movimentar bilhões de dólares em transações que superam em muito direitos de imagem e o traslado de repórteres de todo o planeta para as imediações do Teatro Dolby, o Kodak de antanho, que pela primeira vez abdicou do vermelho-sangue e deixou-se forrar de uma cor adamascada — sinal dos tempos, mas quem se importa? São vestidos, extravagantes a ponto de restringir o campo de visão do coitado que não consegue um bom lugar, flashes indiscretos que servem de inconfidentes de namoros até então secretos, comentários generosos de diretores veteranos para colegas ainda com muito chão de salas de montagem a percorrer, e tudo isso vira capital, entenda-se lucro.

O ano de 2023 foi doce para essa entidade angelina a um passo do centenário. Sem ter de fazer concessões visivelmente artificiosas — o que sói acontecer e há de seguir acontecendo pelos séculos dos séculos —, este Oscar teve o condão de agradar a grande parcela de quem dedicou tempo, dinheiro e, por natural, paixão para acompanhar as estreias, se não de todas, de muitas das produções que ganharam a praça nos últimos doze meses, exortando também a essência destacadamente artística dos filmes em escrutínio. Aqui na Bula, falamos em reiteradas ocasiões de quatro deles sob diversos pontos de vista, a começar, claro, pelo grande vencedor da noite. “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, de Daniel Kwan e Daniel Scheinert, recolocou Michelle Yeoh no radar de Hollywood. Yeoh, a primeira asiática a ganhar o prêmio de Melhor Atriz, abriu alas para que o filme dos Daniels, protagonizado por ela, levasse o Homenzinho Dourado mais cobiçado do Dolby. No papel mais complexo de sua dinâmica carreira, Yeoh encarna uma dona de casa cheia de tarefas de que nunca consegue dar cabo; uma microempresária a um passo da bancarrota; uma mãe severa e desprezada; uma filha exemplar que não sabe o que fazer para agradar o pai; uma esposa que experimenta o desprezo de seu marido e se envenena com o próprio amargor; a descendente de imigrantes que não encontra seu lugar no país que também deveria ser seu; a guerreira da batalha perdida contra si mesma. E tantas outras.

Além de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, temos a versão do merecidamente incensado Guillermo del Toro para “Pinóquio”, a fábula do jornalista e escritor italiano Carlo Collodi (1826-1890), assinada com Mark Gustafson, ganhadora do Oscar de Melhor Animação; a releitura do alemão Edward Berger para o livro de Erich Maria Remarque (1898-1970), compatriota do diretor, sobre as agruras de um regimento de garotos assustadiços, que só queriam sobreviver ao horror da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), Melhor Filme Internacional; e o xodó deste seu criado, “Como Cuidar de um Bebê Elefante”, da indiana Kartiki Gonsalves. Ninguém apostou nada na vitória de um documentário hindu — e de curta-metragem —, gênero duplamente maldito em meio a todo glamour tão natural do Oscar (na verdade, o filme foi mesmo solenemente ignorado). Vi-lhe desde o nosso primeiro contato, em 25 de janeiro, méritos na forma, coroada pela fotografia da equipe liderada por Karan Thapliyal, que só tornam ainda mais vigorosa a história, sobre dois cuidadores de elefantes de uma reserva ecológica no sul da Índia. Que sorte a minha! Que sorte a nossa!

Os filmes, por evidente, são todos de 2022, estão elencados seguindo a ordem da importância das láureas com que foram agraciados, e encontram-se no catálogo da Netflix, a exceção de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, a disposição do assinante do Amazon Prime Video. Esse acabou, mas no ano que vem tem mais, e entre um e outro, nós seguimos juntos, ranqueando e tecendo comentários sobre o sem-fim de histórias que, decerto, hão de roubar nossos corações. Viva o Oscar! Viva o cinema!