Inteligente e incômodo, novo suspense da Netflix vai te perturbar até o último segundo Chris Harris / Netflix

Inteligente e incômodo, novo suspense da Netflix vai te perturbar até o último segundo

Em seu primeiro longa-metragem, Nathaniel Martello-White traz um thriller social inspirado em um dos maiores nomes do suspense na atualidade, Jordan Peele, que revolucionou o gênero. Apesar de Peele ser o primeiro nome que vem à mente quando falamos de thriller social, esse estilo não começou por ele. Claro, o realizador trouxe características inovadoras e modernas, mas o cinema já tinha dado seu jeitinho de fazer críticas à hegemonia masculina branca e rica por meio do suspense. Alguns exemplos são “Candyman”, “Coração Satânico”, “A Noite dos Mortos-Vivos”, “O Bebê de Rosemary”, dentre outros.

O medo da violência é uma das fobias mais populares e primitivas da raça humana. Não à toa que a humanidade desenvolveu todo um sistema de controle e proteção do corpo e da propriedade privada. Aliás, os corpos de minorias, como mulheres, negros, crianças e homossexuais sempre foram violáveis, mas não os corpos dos homens brancos, muito bem protegidos legalmente, culturalmente, socialmente e politicamente. E é focado nessa questão que os thrillers sociais, especialmente os modernos, vêm se desenvolvendo.

A questão é que cineastas como Peele e Martello-White focam nos terrores vividos pela minoria, principalmente os negros. Eles transpõem seus maiores temores, traumas e vivências para dentro das telas em forma de suspense psicológico, jogando com a mente dos espectadores. No caso de “Excluídos”, o título do filme faz referência à exclusão social sofrida pelos negros, que nunca são bem-vindos, bem-quistos ou bem olhados nos locais predominantemente brancos, mas também a Marvin (Jorden Myrie) e Abigail (Bukky Bakray), filhos do primeiro casamento de Neve (Ashley Madekwe).

No enredo, Neve é uma mulher negra, pobre e esposa de um marido violento. Insatisfeita com sua realidade, ela decide deixar tudo para trás, incluindo os dois filhos, Marvin e Abigail. Quase vinte anos depois, ela agora vive em um bairro de classe média alta, é casada com um bom marido branco, Ian (Justin Salinger), e tem dois filhos adolescentes exemplares, Sebastian (Samuel Paul Small) e Mary (Maria Almeida). Ela é vice-diretora da escola particular dos abastados e leva uma vida completamente diferente da de seu passado. Até que dois estranhos aparecem no bairro.

Marvin e Abigail decidem ir atrás da mãe que os abandonou e que hoje vive uma nova vida como se eles não existissem. Aparecendo em todos os lugares em que Neve frequenta, os irmãos estão prontos para dar início à sua vingança. É preciso destacar que Neve age como se fosse branca, renegando tudo que remete à cultura afro e, inclusive, sem reconhecer os filhos do passado, diz a eles que eles sujam a paisagem. Já Marvin e Abigail foram criados pelo pai violento em situação de pobreza. Ou seja, eles não conheceram uma vida que fosse melhor que isso. Quando veem que sua mãe os excluiu para usufruir de uma situação financeira e social melhor, negando-os o direito de também participar disso, eles decidem atormentar a nova família perfeita de Neve.

Por outro lado, Ian e os filhos, Sebastian e Mary, sequer sabiam do passado da mãe e, de repente, se veem ‘reféns’ desses visitantes desagradáveis. Ou seja, todos estão presos em um conto de terror aqui. Não há ninguém beneficiado nesta história. Apesar de sua fatia de responsabilidade, todos são vítimas de uma tragédia social que se construiu ao longo da história da humanidade. E o final da história, sem spoilers, é no mínimo tragicômica.

Sem sombra de dúvidas, o suspense se Martello-White agrega ainda mais ao cinema de comentário social, expondo medos e experiências dos negros em forma de metáforas, ironias e jogos mentais. Um filme para apreciar e digerir e que, assim como os de Peele, para dar voz aos oprimidos.


Filme: Excluídos
Direção: Nathaniel Martello-White
Ano: 2023
Gênero: Thriller
Nota: 9/10