Aplaudido de pé no Festival de Cinema de Cannes, filme com Matt Damon acaba de chegar à Netflix Divulgação / Focus Features

Aplaudido de pé no Festival de Cinema de Cannes, filme com Matt Damon acaba de chegar à Netflix

Tom McCarthy conhece a América profunda e, mais que isso, conhece os personagens que habitam-na. Um deles é Bill Baker, ex-operário de uma companhia petrolífera cuja vida não tarda a entrar num torvelinho de ira, desconforto e anseio por justiça frente ao que considera um grande equívoco. Bill parece querer passar despercebido embaixo de velhos bonés de beisebol e de camisas xadrez puídas, emoldurados por um cavanhaque grosso, mas não se engane: o personagem central de “Stillwater: Em Busca da Verdade” não tem nada de ingênuo.

McCarthy e os corroteiristas Thomas Bidegain e Marcus Hinchey inspiram-se vagamente no caso de Amanda Knox, uma universitária americana condenada por matar sua colega de quarto enquanto estudava na Itália, em 2007, reservando para o desfecho reviravoltas tão surpreendentes quanto as do caso real, apostando na performance reconhecidamente perspicaz de Matt Damon, que consegue transformar um dos tantos homens invisíveis de sociedades hipercapitalistas mundo afora.

Billnãodá nenhum sinal de que queira deixar Stillwater, Oklahoma, uma cidadezinha simpática (e empobrecida) do meio-oeste americano, mas, parece que depois de ter perdido o emprego na petrolífera a vida o empurra para caminhos que ainda não sabe como vai trilhar. McCarthy vai abrindo a caixa-preta de seu protagonista com cautela, mostrando que era um funcionário exemplar e que sua saída do emprego de que gostava tanto não foi culpa sua.

Ele se dedica com o mesmo afinco à nova colocação, retirando os escombros do último tornado em Shawnee, num condado vizinho, não para ser efetivado nos quadros da empresa, mas porque não consegue ser de outro jeito, e o diretor trata de expor o quanto pode a personalidade incorruptível do anti-herói de Damon a fim de realçar sua metamorfose no terceiro ato, quando fica mais parecido a Allison, a filha única que cumpre nove anos de prisão por envolvimento no homicídio de Lina, uma garota muçulmana com quem dividia um quarto e pela qual acabara se apaixonando. 

A ação migra de Stillwater para Marselha, onde Ally está presa, de maneira fluida, e o público só começa a estranhar aquele ambiente no momento em que Bill passa a visitá-la na cadeia, o pulo do gato para que despontem as nuanças da psicopatia latente da garota, malgrado o pai só vá duvidar de sua inocência numa cena em que Damon quase não fala, deixando para Abigail Breslin a responsabilidade de, com um texto contundente, dito entre soluços e choro sincero (ou bem-fingido), inspirar a pena ou a revolta de quem assiste. Enquanto isso, Bill se aproxima de Maya e sua mãe, Virginie, as marselhesas que conhecera no hotel em que ficara hospedado. As personagens de Camille Cottin e Lilou Siauvaud dão algum calor aos dias desse homem injustamente amargurado, mas, conforme se vê na conclusão, é impossível fugir do destino, tanto um menos ele, um sujeito que sente-se obrigado a não trair seu próprio sangue.


Filme: Stillwater: Em Busca da Verdade
Direção: Tom McCarthy
Ano: 2021
Gêneros: Thriller/Crime
Nota: 8/10