O filme brasileiro que fez as pessoas chorarem nos cinemas está na Netflix Divulgação / Sony Pictures

O filme brasileiro que fez as pessoas chorarem nos cinemas está na Netflix

Um pai ausente pode trazer um enorme vazio para a vida dos filhos, mas um pai ruim pode ser muito mais traumático. “O Filho Eterno”, filme de 2016, dirigido por Paulo Machline, parece ser a história de um menino com Síndrome de Down, mas não é. O enredo é sobre um mau pai castigando seu filho por não ter nascido como ele idealizava. Assistir ao filme pode ser uma experiência incômoda, porque o protagonista passa quase tempo inteiro sendo um péssimo ser humano.

Não posso comparar aqui a obra cinematográfica ao livro de Cristóvão Tezza, no qual foi inspirado, porque não o li. Mas, aqui, nessa produção audiovisual nos deparamos com Roberto (Marcos Veras) um professor universitário e escritor que está ansioso pelo nascimento do filho, Fabrício. A mãe, Cláudia (Débora Falabella), entra em trabalho de parte no dia do jogo do Brasil contra a Itália, na Copa de 1982. Há uma grande expectativa de Roberto para os dois eventos: a vinda da criança e o resultado da partida

Para a tristeza do protagonista, nenhuma das coisas acontecem como ele espera. O tão esperado filho nasce com Síndrome de Down e o Brasil é eliminado da competição. Eu não havia nascido ainda em 1982, mas acredito que havia muitos mais tabus e preconceitos em relação às pessoas com trissomia do cromossomo do que hoje em dia. E, Roberto, embora tente aceitar a situação e encarar a paternidade com responsabilidade, vai se revelando cada vez mais inábil na arte de amar incondicionalmente.

E aí nosso protagonista, a cada cena, se torna um marmanjo derrotado, envergonhado, arrogante, mesquinho e traidor. Ele não é apenas incapaz de amar o filho como ele é, mas ainda pune o garotinho por ter frustrado suas expectativas. O trata como uma pessoa incapaz, grita com o menino durante a terapia, é impaciente, não comparece no aniversário de quatro anos da criança propositalmente e se transfere para uma universidade em Florianópolis — eles moram em Curitiba —, para ficar o mais distante possível da própria família.

Na capital, ele vive como um boêmio, cercado de alunos que o idolatram e sendo infiel à esposa com uma de suas estudantes.  Para a amante, ele diz que não tem filho. Afinal, seria vergonhoso demais assumir ser pai de uma criança, na cabeça dele, considerada imperfeita ou diferente.

Enquanto Roberto age igual um adolescente maldoso, a vergonha real é toda de quem assiste ao filme e testemunha esse comportamento. Eu não sei se a intenção da história é relativizar os erros da paternidade e fazer o protagonista encontrar seu caminho para a redenção ou deixar os espectadores revoltados com o comportamento de Roberto, que realmente foi um péssimo pai durante muitos anos da infância de Fabrício, interpretado já maiorzinho pelo adorável Pedro Vinícius.

O filme é excelente. A trilha sonora de Guilherme e Gustavo Garbato é tão melancólica que corta lá no fundo da nossa alma e nos faz aprofundar melhor no drama de Cláudia, que ama, compreende e se dedica ao filho com devoção tão genuína e sincera. Ela não apenas aceitou o desafio de ser a mãe de uma criança com Síndrome de Down, ela aceitou ser mãe sob qualquer circunstância. Ela sabe que qualquer criança seria um trabalho desafiador e que, no caso de seu filho, ele só precisa de um pouco mais de compreensão e cuidado.

O protagonista nada carismático não é um defeito do filme, mas um ponto de discussão. Afinal, seus erros são humanizados, mas podem ser relativizados? Como agiríamos em seu lugar? Quais as diferenças entre criar um filho com e sem a trissomia? Muito bom que tenham colocado a discussão à mesa no cinema. Afinal, é para isso que serve a arte.


Filme: O Filho Eterno
Direção: Paulo Machline
Ano: 2016
Gênero: Drama
Nota: 8/10