Emocionante e violento, filme com Denzel Washington, na Netflix, vai te manter na ponta do sofá roendo as unhas

Emocionante e violento, filme com Denzel Washington, na Netflix, vai te manter na ponta do sofá roendo as unhas

Segredos de Estado prestes a serem descobertos quase sempre rendem boas histórias. O cidadão comum é bombardeado por notícias — em grande parte falsas — acerca da existência de papéis ocultos em que foram publicadas apreciações sobre os mais variados assuntos, de segurança nacional a informações privilegiadas do mercado financeiro nas mãos de um grupo de megainvestidores, passando por averiguações da comunidade científica a respeito da próxima peste a atacar o gênero humano ou qual a verdadeira composição de pesticidas e outros insumos usados na produção de alimentos, e uma boa medida de tudo isso nunca sai da esfera da conjectura irresponsável e criminosa, que dissemina ignorância e pânico mundo afora. As tais teorias da conspiração nunca estiveram tão em alta, graças justamente à curiosidade mórbida inerente ao homem, um mal que talvez só faça recrudescer daqui até o fim dos tempos, legitimando o século 21 como a era da falsa informação.

Evidentemente nem tudo é um jogo de narrativas e existem as preocupações com que nações sérias são obrigadas a se preocupar, e para tanto dispõem de um aparato inteiro de acadêmicos, burocratas e agentes voltados à resolução dos conflitos que envolvem as questões profundas e invisíveis das nações, principalmente das grandes, implicadas em toda sorte de imbróglios. Seus povos lhes devotam uma boa vontade sem limite, tendo-lhes como os genuínos super-heróis que hão salvar a todos da extinção mais perversa, até que o caldo entorna de uma vez e se conhece pelos veículos de comunicação os intestinos de esquemas fraudulentos, negociatas de parlamentares com lobistas de grandes corporações, tramoias de consequências irrefreáveis, muito mais graves se envolvem precisamente a indivíduos que deveriam zelar pelo bom funcionamento das instituições. Esses frutos envenenados caem de uma árvore corrompida, decerto, mas tem um potencial destrutivo bastante peculiar. O chileno-sueco Daniel Espinosa envereda pelo teor de sátira sociopolítica a fim de tecer seus comentários mordazes a respeito da corrupção endêmica nos aparelhos do estado, no caso a americana CIA, repleta de gente muito perigosa, que faz o termo “fogo amigo” se conservar tão atual. “Protegendo o Inimigo” (2012) condensa várias tramas num só enredo, característica que aliada à espiral de reviravoltas, dá ao filme a injeção de endorfina que o espectador também sente.

Matt Weston encarna o arquétipo do servidor público sem máculas. O agente de Ryan Reynolds dá o sangue (sem figura de linguagem) a fim de se destacar em cada nova missão para a qual é designado, tentando desesperadamente ascender na hierarquia da espionagem americana, mas é enviado à Cidade do Cabo, na África do Sul, para gerir um esconderijo, lugar onde são mantidos os detentos que oferecem risco devido a sua, digamos, intimidade com o expediente da agência. Weston tem em seu poder Tobin Frost, que conforme o roteiro de David Guggenheim explica, integrara os quadros da CIA até pouco tempo atrás, mas foi expulso depois que uma investigação interna o apontou como o pivô de uma concertação criminosa que se apoderava de dados ultrassecretos e os vendia a potências estrangeiras. Esse inimigo número um da soberania dos Estados Unidos, um verme que recobre de opróbrio a própria terra em troca de algumas centenas de milhares de dólares, inspira não asco, mas uma simpatia quase patológica, graças ao carisma magnético de seu intérprete. Mais uma vez, Denzel Washington rouba a cena na pele de um adorável anti-herói, outro dos tipos gauches da vasta galeria que o ator ostenta, algo entre seus personagens em “O Voo” (2012), dirigido por Robert Zemeckis, e “O Protetor” (2014), levado à tela por Antoine Fuqua. Cansado de correr de um lado para o outro acossado por vigaristas muito mais convictos, Frost bate a porta da embaixada americanas em Joanesburgo na intenção de se entregar às autoridades e ser extraditado. O conflito central do filme reside justamente aí: esses homens vêm em seu encalço e cabe a Weston mantê-lo a salvo para que chegue a Washington em segurança e conte tudo o que sabe. Naturalmente, há gente da própria CIA, a exemplo do comissário David Barlow, de Brendan Gleeson, que não está nada satisfeito com os rumos que tomou o caso.

Espinosa e Guggenheim renovam um argumento velho como o próprio cinema, ajudados pelo talento de Washington e Reynolds, nessa ordem, cada qual brilhando a seu tempo — malgrado as quase duas horas de projeção se arrastem em tantas circunstâncias e acabem pesando. Muito pior é ver Vera Farmiga e Sam Shepard (1943-2017) miseravelmente desperdiçados em papéis anódinos, que não acrescentam e tendem a confundir. Isto posto, “Protegendo o Inimigo” é uma boa fonte de entretenimento.


Filme: Protegendo o Inimigo
Direção: Daniel Espinosa
Ano: 2012
Gêneros: Ação/Policial/Espionagem
Nota: 8/10