O melhor filme de ação do cinema mundial nos últimos 2 anos está no Prime Video Divulgação / Focus Features

O melhor filme de ação do cinema mundial nos últimos 2 anos está no Prime Video

Segundo a mitologia nórdica, todo homem dispõe de um tempo exato no plano material, nem demasiado longo nem muito curto, apenas o bastante para que chegue, descubra-se, empenhe-se em desenvolver seus talentos e ganhar a vida com eles e deixe sua marca por meio do trabalho, para então fazer a travessia e partir para uma outra terra, do qual ninguém volta em carne.  

As nornas, as três anciãs da mitologia nórdica que urdem o destino dos deuses e homens e zelam pelo cumprimento e preservação das leis que regem toda forma de vida sob o sol, fabricam, mantêm e rompem o fio que prende as criaturas neste mundo — Cloto, Láquesis e Átropos, suas homólogas nas fábulas gregas —, estão sempre muito perto de Odin, o Pai de Todos, o deus dos deuses, o que fica claro  já na abertura de “O Homem do Norte”, a arguta reconstituição que Robert Eggers faz de uma veneranda lenda dos povos escandinavos, facilmente reconhecível pelo público na pena de um gênio.  

Entre 1599 e 1601, William Shakespeare (1564-1616) adaptou a história de tormento moral e martírio do corpo de um príncipe dinamarquês ávido por vingar o pai em “Hamlet”, aventura a que Eggers também se lança conservando os fonemas e caracteres tipográficos do original, o que dá origem a Amleth, um príncipe guerreiro viking de um reino perdido entre o que hoje seria a Noruega ou a Suécia, que em criança presenciara o assassínio do pai pelo irmão bastardo deste.  

O diretor prima por mexer pouco na estrutura básica do conto, assinando com o poeta e romancista islandês Sigurjón Birgir Sigurðsson, o Sjón, famoso por composições em parceria com a cantora Björk, sua patrícia, e pela trilha de alguns longas de Lars von Trier, um texto no qual a violência simboliza um personagem autônomo no eixo narrativo, sem que jamais ninguém questione sua onipresença. 

Eggers gosta de provocar no espectador sensações que o transportem direto para a atmosfera de terror e desajuste mental que sempre há em seus filmes. Já o fizera em “O Farol” (2019) e “A Bruxa” (2015), erigindo metáforas plenas de diabólico lirismo sobre a loucura, e aqui quer que a audiência exceda seus limites, com a ajuda da música de Robin Carolan e Sebastian Gainsborough e da fotografia, bela e macabra, a cargo de Jarin Blaschke.  

Na primeira cena, resta inequívoco que se está diante de uma obra-prima do cinema contemporâneo, com a edição de Louise Ford aproximando a perspectiva inovadora do Eggers acerca do mito de Amleth do “Hamlet” (1948), dirigido e protagonizado por Laurence Olivier (1907-1989), um dos melhores atores de todos os tempos, onde o príncipe intui que nem tudo é o que parece nesse reino podre. A sequência de Odin amaldiçoando Amleth e sua descendência, por causa da traição letal que se vai desenrolar, é uma louvável apropriação do que Olivier apresenta, na célebre intervenção das feiticeiras e dos espectros opacos do Hel, a casa daqueles que morrem sem glória, enfermos ou em idade avançada. 

Alexander Skarsgård leva às raias do intolerável a mortificação de Amleth por reparar o homicídio de seu pai, o rei Aurvandill de Ethan Hawke, já esboçada pelo anti-herói menino, na pele de Oscar Novak. Ao cabo de 137 minutos, quando consegue, afinal, cumprir o destino que dera-se a si mesmo, o príncipe rebelde acha tempo para o amor, mas não como homem. No transcurso do filme, Olga, a guardiã da Floresta de Bétulas, surge com maior destaque, chance que Anya Taylor-Joy agarra com unhas e dentes na intenção de frisar que esta é mesmo uma trama para além deste triste hoje. 


Filme: O Homem do Norte 
Direção: Robert Eggers 
Ano: 2022 
Gêneros: Ação/Thriller/Ação/Aventura/Drama  
Nota: 10