Ganhador do Oscar, obra-prima na Netflix envelheceu como vinho e ficou ainda melhor com o tempo Divulgação / Columbia Pictures

Ganhador do Oscar, obra-prima na Netflix envelheceu como vinho e ficou ainda melhor com o tempo

A família Coppola é bastante tradicional em Hollywood. Seu legado artístico não começou com o diretor de “O Poderoso Chefão”, Francis Ford Coppola, mas com Carmine, pai do cineasta, que chegou a ganhar o Oscar por suas composições em filmes. São gerações da família ítalo-americana envolvida na sétima arte e que incluem os atores Talia Shire, Nicolas Cage, Jason Schwartzman, Robert Schwartzman; o executivo de cinema e irmão de Francis, August; a esposa, Eleanor, que é documentarista e diretora de arte; também os filhos do casal, Roman e Sofia, ambos realizadores. Com uma família de tanto destaque na indústria, é difícil escolher outro caminho.

Sofia começou bem cedo. Com apenas 18 anos escreveu um curta para “Os Contos de Nova York” e chegou a se envolver no projeto para o epílogo de “O Poderoso Chefão”, interpretando a filha de Don Michael Corleone, papel mais icônico de Al Pacino, Mary. Com uma carreira com alguns altos e baixos, Sofia conseguiu estabelecer seu nome no cinema sem grandes danos, apesar de ter sido massacrada por sua atuação na terceira parte do filme de máfia que consagrou seu pai, e conseguiu conquistar a crítica com “Virgens Suicidas”, “Encontros e Desencontros”, no qual levou o Oscar de melhor roteiro original, e “Maria Antonieta”, também ganhador do Oscar, mas na categoria de melhor figurino.

Nesta biografia da vida da trágica rainha consorte da França no século 18, Coppola mostra o que acontece quando adolescentes ficam responsáveis pelo destino de uma nação. Não qualquer nação, mas umas das mais influentes na política global. A erupção social tinha por onde começar. As coisas não iam nada bem, enquanto a esposa de Luis 16, Maria Antonieta (Kirsten Dunst) dava festas no castelo. O povo sofria com a fome e a miséria. Mas a verdadeira revolução não começou entre os mais humildes, mas foi propelida pela burguesia e a classe média, que começou a ver seus “direitos” podados. Eles queriam usufruir mais dos benefícios da nobreza e do clero e aumentar seus lucros nos negócios. Por meio dos iluministas, propagaram suas ideias antiabsolutistas e antimercantilistas.

O destino de Maria Antonieta , Luís 16 (Jason Schwartzman) e seus filhos foi trágico, como já mostrou a história. Mas não mais trágico do que de uma sucessão de líderes do movimento revolucionário que tomou conta do país e igualmente parou na guilhotina. A Revolução Francesa teve impactos extremamente relevantes e que redefiniram as estruturas de poder não apenas na França, mas no mundo todo, selando o fim do feudalismo, mas levando o país, pouco tempo depois, a viver sob o regime de Napoleão Bonaparte. Como todo militar, o estadista soube suscitar o orgulho nacionalista nos franceses.

As cenas do filme de Coppola dividem a vida de Maria Antonieta em episódios de extrema frivolidade, gastos supérfluos e vulgaridades. Mas não só isso, pressão da Corte sobre seu comportamento e a completa falta de privacidade (e inclusive traumática) ao ter de expelir uma criança pela vagina na frente de dezenas de aristocratas curiosos. Sofia Coppola explora esses contrastes de forma curiosa. Os sentimentos e emoções de Maria Antonieta não são exatamente retratados de forma profunda e dramática, mas através de pequenos gestos, suspiros, olhares perdidos enquanto canções melancólicas tocam ao fundo.

Um dos maiores trunfos de Coppola aqui é a estética preciosista, que explora cada belíssimo detalhe da arquitetura em rococó, dos vestidos repletos de babados, as maquiagens femininas e masculinas impecáveis de bonecas, os doces coloridos e salivantes que decoram os cenários, os jardins suntuosos e florais que mostram como, embora curta, a vida de Maria Antonieta e Luís 16 foi, enquanto durou, um sonho esbanjador.

A trilha sonora divertida, selecionada por Coppola, ostenta sons de bandas de rock alternativo, como The Strokes, Siouxsie, New Order e The Cure, quebrando qualquer tentativa de transformar o filme em um épico erudito demais e fora da alçada do público mais jovem e popular. Sofia acerta na linguagem, dando um perfil “cool” e autêntico à sua obra, que conforme envelhece parece melhorar ainda mais seus aromas e texturas.


Filme: Maria Antonieta
Direção: Sofia Coppola
Ano: 2006
Gênero: Biografia/Drama/História
Nota: 10