Ovacionado no Festival de Sundance, estreia da Netflix é o novo queridinho da crítica Sergej Radovic / Netflix

Ovacionado no Festival de Sundance, estreia da Netflix é o novo queridinho da crítica

Um vídeo circula na internet. É uma reprodução do programa da TV Globo “Profissão Repórter”. O jornalista faz uma pergunta para um casal em um mutirão de serviços públicos. A mulher responde que o marido, insatisfeito com o fato de ela ter esquecido de lavar seu uniforme, ordenou-a, durante a madrugada, para que fizesse o trabalho. O marido, com o rosto borrado, responde que não viu nada de errado com o pedido e que se essa era a forma de ela encarar o ocorrido, que o relacionamento realmente não tinha como dar certo.

A posição das mulheres na sociedade tem sido, quase sempre e há muito tempo, de subalternas de seus esposos e pais sem qualquer tipo de remuneração. Ser tratada sob esse tipo de condição demonstrada no vídeo não é incomum. Aliás, é até naturalizado. Nas redes sociais, uma multidão de marmanjos defende o ponto de vista do homem.

“Jogo Justo” estreou no Festival de Sundance deixando o público sem fôlego. O enredo gira em torno de um jovem casal no auge de seu relacinamento, moradores de Nova York e colegas de trabalho em uma empresa do mercado financeiro. Ambos são ambiciosos e persistentes, e almejam ser promovidos no local onde trabalham, enquanto em seu apartamento vivem noites calorosas e sonham com um futuro juntos. Mas as coisas mudam completamente quando Emily (Phoebe Dynevor) sobe de cargo e se torna uma gerente de pastas. Seu noivo, Luke (Alden Ehrenreich), passa a ser seu mero funcionário, sendo obrigado a seguir as tarefas nas quais ela o designa.

Ser chefe nem sempre é uma glória para Emily. Apesar das comissões de seis dígitos e dos carros com motoristas, qualquer mínimo erro é motivo para que ela seja desqualificada na frente de seus colegas. As mulheres, quando conseguem boas posições, precisam redobrar os cuidados com a aparência, as decisões e a forma como falam, pois sempre estão diante de um tribunal inquisidor pronto para condená-las.

Mas não é assim que Luke vê Emily em sua nova posição. Para ele, a noiva usurpou o cargo de seus sonhos. Se sentindo frustrado e fracassado, ele perde o desejo pela noiva. Em seus curtos e grossos diálogos com ela, Luke trata de despejar insultos e desprezos, além de sugerir que ela tenha algum caso com o chefe que justifique seu cargo. Luke não comunica seus pais sobre o noivado, esgueira-se de ter momentos solitários e íntimos com Emily e sempre age na defensiva, como se estivesse acuado.

Enquanto tenta se relacionar bem com os colegas de trabalho, ela aproveita os poucos momentos em casa para tentar reacender a chama entre ela e Luke, mas o noivo sempre dá um jeito de evitá-la. Conforme ela se mostra mais competente e digna de seu cargo, mais o noivo fica ressentido com o sucesso da noiva, se sentindo menos másculo e dominante. A inveja de Luke cresce enquanto o filme desdobra um suspense cheio de paranoia, tensão e violência física e psicológica. A diretora e roteirista Chloe Domont revela na tela a realidade tóxica de relacionamentos quando os homens não estão prontos para um mundo em que eles não o governem.

“Jogo Justo” é uma experiência eletrizante  e interessante, que merece ser degustado.


Filme: Jogo Justo
Direção: Chloe Domont
Ano: 2023
Gênero: Suspense/Drama/Mistério
Nota: 8/10