Com influências de “John Wick” e “Kill Bill”, filme na Netflix é perfeito para os amantes de ação Divulgação / Dark Horse Entertainment

Com influências de “John Wick” e “Kill Bill”, filme na Netflix é perfeito para os amantes de ação

Pode não ser exatamente fácil, mas sempre se pode escolher, entre duas ou mais possibilidades, a que mais se adequa ao que o restante da civilização esperaria de nós. À medida que o tempo passa, mais urgente se torna parar, tomar algum fôlego e refletir sobre o que se fez da vida até então. Inexoravelmente, irão emergir conclusões nada agradáveis, pouco serenas, com as quais se precisa conviver, administrando os conflitos internos e as crises de consciência que advirão daí. Inspirado na graphic novel “Polar: Came from the Cold”, do cartunista espanhol Víctor Santos, “Polar”, lançado em 2019 e dirigido por Jonas Åkerlund, conta a história de Duncan Vizla, o assassino profissional interpretado por Mads Mikkelsen à beira da aposentadoria depois de anos do que se poderia definir como bons serviços, caso se estivesse falando de um homem de bem num trabalho decente. Não, não foi Vizla quem escolheu assim: na verdade, a organização criminosa para a qual ele trabalha adota uma política bastante específica para o seu caso e não mantém em sua folha de pagamento matadores com mais de cinquenta anos, a fim de evitar problemas correlatos a deficiências visuais e males degenerativos, como o de Parkinson, mas oferece uma generosa pensão, quase integral, em reconhecimento aos tantos anos de parceria. 

Costumava ser uma raridade alguém com esse perfil atingir tal marca, o que implicava em lucros astronômicos para a empresa, gerida por Blut, personificado por um Matt Lucas que evidencia bem a hediondez de sua figura e dos interesses que defende. Essa fortuna permanecia, então, no caixa da própria quadrilha, mas de uns tempos para cá, a resistência dos atiradores, a começar por Vizla ele mesmo, tem surpreendido o mandachuva da organização criminosa, que pensa num possível contra-ataque: despachar à Bielorrússia um quarteto de assassinos para dar cabo do protagonista, o mais experiente deles, enviados por Vivian, de Katheryn Winnick, o que veterano acredita ser a equipe com quem irá atuar em sua derradeira missão. Na verdade, esse é o eixo sobre o qual gira o plano de sua execução, prontamente desvendado por ele, que elimina seus oponentes um por um, sem prejuízo da recompensa oferecida, ou Blut e Vivian teriam de confessar tudo. Vizla recebe os dois milhões de dólares a que tem direito, via transferência eletrônica, e parte para seu refúgio em Triple Oak, pequena cidade de Montana, no oeste dos Estados Unidos, a salvo do radar da quadrilha e onde é apenas mais um dentre seus poucos habitantes. É lá que esse forasteiro, exilado até da própria vida, parece encontrar a oportunidade de se dar um novo destino, com direito à realização de que só o amor é capaz personificada por Camille, a vizinha misteriosa interpretada por Vanessa Hudgens. Conforme se vê depois de algum tempo, também Camille se lhe revela uma ingrata surpresa, numa boa reviravolta do texto de Jayson Rothwell.

Encampando uma premissa nada original, a do bandido de primeiro escalão que se acha vítima de um ardil de seus patrões e passa a fazer da vingança seu norte na vida, Åkerlund entrega um filme algo surpreende e ousado, muito devido à fotografia idealizada por Pär M. Ekberg, que se empenha em fugir ao destacadamente sombrio. Em “Polar”, Mikkelsen continua o grande ator de sempre, esgueirando-se por entre o gore e a pornografia barata e gratuita, e promovendo a trama à categoria de verdadeira experiência sinestésica, em que é indispensável dar atenção a cores, luzes e sons, mais ou menos frementes de acordo com o ponto da história que se avizinha. A participação especial de Richard Dreyfuss, num papel instigantemente revelador — embora algo diminuto — coroa o filme não como um dos melhores desse gênero, mas decerto como um dos que mais ousaram na mistura de elementos cênicos e narrativos os mais díspares.


Filme: Polar
Direção: Jonas Åkerlund
Ano: 2019
Gêneros: Ação/Suspense
Nota: 8/10