A comédia mais amada dos anos 2000 está na Netflix Divulgação / 20th Century Studios

A comédia mais amada dos anos 2000 está na Netflix

Toda idade tem sua beleza, seus desafios e apresenta os cenários muitas vezes definidos por uma fantasia quase patológica que podem tanto nos arrastar numa espiral de avanços ou para o limbo das derrotas que acabam tardando muito a serem esquecidas. Para além de tudo quanto a vida trata logo de ensinar a cada um, somos instados a nos conhecer, a aguentar a solidão que maltrata uns mais que outros, mas só depois do tempo necessário para se entender que até o sentimento mais vigoroso, mais resistente, se desvanece antes do que se pensa, e aí entra “Show de Vizinha”. A comédia juvenil de Luke Greenfield espraia-se sobre o cotidiano exasperantemente banal de um garoto que, como se pode imaginar, espera em vão pelo amor — ou pelo sexo, sua forma mais imediata e mais arriscada — até que, como se por encanto, ele bate a sua porta. O filme de Greenfield, claro, não tem mistério, mas não precisa; quem já foi adolescente — ou solitário, o que dá quase no mesmo — entende muito bem aonde o diretor quer chegar.

Matthew Kidman parece conformado em passar o resto da vida numa torturante virgindade, até que seu destino, enfim, parece muito perto de uma mudança radical. O texto de Brent Goldberg, David Wagner e Stuart Blumberg abusa desses elementos tão típicos dos folheteens hollywoodianos, ancorando a trama central, em especial durante a introdução, na figura de Matthew, cujo sobrenome é uma alusão meio estúpida a Tom Cruise em “Negócio Arriscado” (1983), de Paul Brickman, cujo personagem, Joel Goodson, enfrenta apuros depois de uma noite de folguedos de alcova com Lana, a prostituta vivida por Rebecca De Mornay. Não demora para que, tal como Joel, Matthew também bote a cabeça a prêmio, seduzido por encantos de mulher. No caso, Danielle, que, segundo o título original, está ao alcance de um braço, o que, definitivamente, não significa que vá ceder de primeira. O trio de roteiristas propõe uma situação nada verossímil, mas não absurda, para o contato inaugural entre Matthew e Danielle, no amálgama bastante equilibrado de erotismo, suspense, comédia e ação em que Emile Hirsch e Elisha Cuthbert, muito confortáveis em seus papéis, transmitem à audiência a diversão da cena, inclusive quando da revelação do segredo de polichinelo que cerca a aura de deusa olímpica da antimocinha de Cuthbert, foco do drama possível num enredo desse jaez.

Em algum ponto do segundo ato, Greenfield introduz à narrativa a figura de Kelly, de Timothy Olyphant, espécie de tutor “artístico” de Danielle particularmente disposto a matar e morrer para ter de volta sua estrela, num comentário sutil, porém mordaz, a respeito da dureza da vida, mormente quando se é jovem e mulher. Matthew também parece inclinado a ignorar chantagens o opróbrio de circunstâncias ignominiosas que todos nos imaginamos capazes de sublimar. Entretanto, quem já avançou algumas casas no jogo perigoso jogo que é viver sabe que um amor como o deles é muito mais alegórico que de fato inspirador.


Filme: Show de Vizinha
Direção: Luke Greenfield
Ano: 2004
Gêneros: Romance/Comédia
Nota: 7/10