Filme surpreendente e inesperado na Netflix vai virar seu mundo de cabeça para baixo Divulgação / Tribeca Film Festival

Filme surpreendente e inesperado na Netflix vai virar seu mundo de cabeça para baixo

Mulheres deparam-se com situações perigosamente constrangedoras desde que o mundo é mundo, e em que pese ter conquistado direitos a custo — muitas vezes da própria vida —, são frequentes situações nas quais são obrigadas a recorrer a uma violência desproporcional para livrar-se de seus algozes. A protagonista de “Infiltrada: Golpe de Vingança” vai às últimas instâncias na tentativa de uma volta no tempo sui generis, em que, numa só tacada, interrompe um ciclo de delitos hediondos e recupera sua vida, tirando da mão de bandidos alguém que ama e precisa dela. Josef Kubota Wladyka aborda uma modalidade muito específica de crime, incluindo em seu texto as sugestões de quem sente na carne a dureza da ficção. A corroteirista Kali Reis personifica alguns dos incômodos que o diretor empenha-se em desmistificar, trazendo à cena muito de sua história mesma, sob dois aspectos principais. Atual campeã mundial de boxe na categoria dos meio-médios, Reis, descendente de indígenas de Buffalo, norte do estado de Nova York, encampa uma verdadeira batalha fora dos ringues como embaixadora da MMWIG (Missing and Murdered Indigenous Women and Girls, ou “Mulheres e Meninas Indígenas Desaparecidas e Assassinadas”), e lança mão do boxe para despertar nesse público a necessidade de se enxergar como capaz de tomar posse de seu destino, evitando se deixar iludir por promessas fantasiosas e defendendo-se de espertalhões que fazem delas um negócio cada vez mais lucrativo, muito graças à vulnerabilidade nesse estrato social.

A bem cuidada produção de Darren Aronofsky proporciona a riqueza de detalhes que merece um enredo fundamentalmente dúbio, propenso a interpretações as mais errôneas. Aronofsky, experimentado nessas tramas, é outro dos mecanismos que, silenciosamente, giram em torno do mistério de Kaylee, uma ex-boxeadora ameríndia hoje fora de combate que deixa-se capturar por um bando de traficantes de mulheres para forçar um reencontro com Weeta, a irmã interpretada por Mainaku Borrero, sumida há alguns anos na volta para casa depois de um treino. Wladyka transita com desenvoltura da esperança irracional da personagem de Reis para o cartesianismo na abordagem de uma chaga a um só tempo tão viva e tão pouco atacada nos Estados Unidos deste princípio de século 21. A epidemia de mulheres nativas que simplesmente desaparecem, sem instigar nas autoridades um décimo da empatia e da preocupação que tomam o diretor e sua atriz principal, é uma questão aparentemente insolúvel, cujo cerne Wladyka e Reis atingem mediante a competente exploração de muitas das zonas cinzentas de um mal sem diagnóstico, que começa nunca se sabe exatamente onde e tanto menos desencadeado e sob os auspícios de quem. Para Kaylee, seu corpo é a justiça possível. A fotografia de Ross Giardina, sempre puxando para tons esmaecidos de azul, dá ao espectador a sensação de como Kaylee vê o mundo e a si mesma, uma mulher sem chance de horizonte caso não derrube a impotência que a subjuga. Em nome de Weeta.


Filme: Infiltrada: Golpe de Vingança
Direção: Josef Kubota Wladyka
Ano: 2021
Gêneros: Drama/Suspense
Nota: 9/10