Filme na Netflix vai te fazer acreditar de novo no amor Divulgação / Sony Pictures Classics

Filme na Netflix vai te fazer acreditar de novo no amor

Os filmes de estrada têm a capacidade de transportar não apenas personagens e atores, mas também de envolver a história e o público nas descobertas proporcionadas por uma boa narrativa. Em “Ella e John”, o diretor Paolo Virzì, conhecido pelo aclamado “Capital Humano” (2013), traz uma história tocante, bem-humorada, introspectiva e melancólica, contada de forma magistral graças à atuação impecável do casal de protagonistas veteranos.

A trama gira em torno de uma mulher pragmática, sem grandes sofisticações, casada há décadas com um intelectual que começa a sofrer os efeitos do Alzheimer. Essa é a essência de “The Leisure Seeker” (algo como “À Procura de Lazer”, em tradução livre), um romance de Michael Zadoorian publicado em 2009. No filme, essa mulher corajosa continua a mostrar que não teme nem a vida nem a morte, até que chega o momento de desistir.

Durante o desenrolar da história, Ella Spencer organiza uma viagem dos sonhos com seu marido John. A viagem não é grandiosa, mas sim uma oportunidade de resolver questões pendentes de meio século de convivência. Em um Winnebago 1975 creme com listras verdes, o casal parte de Wellesley, Massachusetts, em direção ao sul dos Estados Unidos para visitar um amigo ilustre de John — ou pelo menos é o que ele acredita. O roteiro, elaborado por Virzì e três colaboradores, leva os protagonistas e o público a um desfecho inesperado.

Desde o início do filme, Ella e John já estão na estrada, como adolescentes que não prestam contas a ninguém. Essa atitude causa preocupação em Will, o filho mais novo, que, ao não encontrar os pais em casa, começa a temer o pior. Ele entra em contato com sua irmã, Jane, e juntos tentam alcançar a mãe, que finalmente atende o telefone e os tranquiliza, embora deixando claro que nada a fará desistir da viagem.

No decorrer da jornada, uma cena em um restaurante revela um lado mais vulnerável de Ella. O diretor sugere que ela sofre de uma doença terminal, o que a obriga a tomar grandes doses de oxicodona e uísque para suportar a dor. Ao retornar à mesa, ela encontra John discutindo com entusiasmo a obra de Ernest Hemingway (1899-1961), cujo memorial em Key West, Flórida, planejam visitar. A interação com Chantal, a garçonete, evidencia o contraste entre os personagens e garante momentos de humor genuíno ao filme.

Helen Mirren, conhecida por sua interpretação da Rainha Elizabeth II em “A Rainha” (2006), e Donald Sutherland, que se destaca no papel de John, entregam performances memoráveis. A química entre eles é palpável, e Sutherland, em particular, impressiona com sua abordagem cuidadosa do personagem, evitando caricaturas mesmo nos momentos mais cômicos relacionados à doença de John.

Virzì toca levemente na questão do sistema de saúde americano e na forma como trata os idosos. John, simpatizante de Donald Trump, é uma escolha de roteiro discutível, mas que se redime em momentos como a recitação de um trecho de “O Velho e o Mar” (1952), levando o público a um mar de nostalgia.

O desfecho do filme é marcante, com Ella tomando uma decisão que escapa a qualquer julgamento fácil. A trilha sonora, cuidadosamente escolhida, destaca a vida em liberdade com músicas de Janis Joplin e Thelma Houston, proporcionando um toque de romantismo e melancolia. “Ella e John” demonstra de forma poderosa que envelhecer e se aproximar do fim inevitável é sempre um drama profundo, e que a travessia desses mares é tudo menos tranquila.


Filme: Ella e John
Direção: Paolo Virzì
Ano: 2017
Gêneros: Comédia/Aventura
Nota: 9/10