Drama europeu perturbador e agonizante na Netflix Divulgação / Netflix

Drama europeu perturbador e agonizante na Netflix

As tropas de Hitler sempre conseguiam descer um pouco mais na escala de barbárie que impunham aos judeus durante a ocupação dos inúmeros territórios ao longo dos seis virulentos anos pelos quais se arrastou a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O belga Tim Mielants se estende sobre uma questão um tanto misteriosa, desvelada aos poucos em cenas de incômodo realismo, façanha nem tão admirável assim dada a natureza bestial da história como de fato aconteceu em seu país naqueles tempos em que a única certeza era a morte violenta e indigna.

Os eventos que Mielants narra em “Caminhos da Sobrevivência” são tristes, cinzentos, monótonos em sua agourenta previsibilidade, conquanto a fotografia de Robrecht Heyvaert quebre a escuridão aqui e ali com o vermelho do sangue que espirra de condenados e algozes.

Em 1942, a tediosa rotina de um policial de rua como Wilfried Wils na Antuérpia dominada pela lei maior do nazismo alemão era perseguir e, e se possível, exterminar todos os judeus que encontrasse em suas incansáveis rondas, sem esquecer de também usurpar-lhes o patrimônio, a fim de que restasse claro quem mandava.

Ao lado dos corroteiristas Carl Joos e Jeroen Olyslaegers, o diretor esclarece que não é função da polícia comum mimetizar as condutas que o Estado reserva àquela categoria inferior de gente, praga que resiste e se vai disseminando pelos porões das casas e becos escuros da cidade, como os ratos, imagem popularizada em “Maus: A História de um Sobrevivente” (1986), a série de cartuns do sueco Art Spiegelman, e reproduzida à mancheia aqui.

No entanto, pela coação obstinada, os recrutas terminam por aderir ao massacre, o que Wils faz não sem tecer um plano qualquer que dê uma chance de fuga às pessoas que é forçado a subjugar. Quando, à noite, durante uma patrulha com Lode Metdepenningen, um colega do grupamento, bate à porta de Chaim Litzke, o judeu endinheirado vivido por Pierre Bokma que o recebe ao lado da mulher e da filha pequena do casal, apavorada, dá-se o horror. O que Wils não previa é o acesso de cólera que dele se apodera, com as consequências que se espraiam pelo que sobra do filme.

Mielants, conhecido pela série “Peaky Blinders” (2013-2022), elabora em “Caminhos da Sobrevivência” um suspense cujo teor fatalista ganha musculatura à proporção que os crimes mais e mais sangrentos dos nazistas enchem a tela. StefAerts e Matteo Simoni ocupam boa parte do enredo, mas isso conta muito mais a favor do que embaraça o andamento da narrativa, acelerado, mas fluido. E, o mais importante: a pecha de “mais uma história sobre o nazismo” não cabe a este filme.


Filme: Caminhos da Sobrevivência
Direção: Tim Mielants
Ano: 2024
Gêneros: Drama
Nota: 8/10