Inspirado em Tarantino, o melhor filme de ação que você verá esta semana acaba de chegar à Netflix Divulgação / A24

Inspirado em Tarantino, o melhor filme de ação que você verá esta semana acaba de chegar à Netflix

“Free Fire: O Tiroteio” é confuso, escuro, frenético, meio pueril e está sempre tecendo insinuações um tanto oblíquas acerca da obra de um dos maiores diretores de Hollywood, que soam ora como homenagem, ora como despeito. Ben Wheatley se apropria de registros de outro cineasta — a exemplo do que faria em “Maldição da Floresta” (2021), com ecos da classe do Stanley Kubrick (1928-1999) de “O Iluminado” (1980) ou “Laranja Mecânica” (1971), junto com o arrojo iconoclasta de John Carpenter em “Eles Vivem” (1988) ou “Halloween — A Noite do Terror” (1978), e na releitura do incomparável “Rebecca, a Mulher Inesquecível” (1940), oito décadas depois de Alfred Hitchcock (1899-1980) ter adaptado o suspense da também britânica Daphne du Maurier (1907-1989) —, agora com muito pouco do brilho da estrela que lhe deu origem.

Há um quê de especulações tarantinescas à “Cães de Aluguel” (1992) ou “Pulp Fiction” (1994) numa espécie de sátira envergonhada aos becos sem saída, metafóricos ou não, das tramas policiais, e esticando-se a corda, chegar-se-ia ao Sam Peckinpah (1925-1984) de “Os Implacáveis” (1972). O que Wheatley pode ter feito de tão errado?

Num velho armazém de Boston, Stevo e Bernie preparam-se para concluir uma negociação de material bélico desviado do IRA, o Exército Republicano Irlandês, por Chris e Frank. A caricatura de Sam Riley e Enzo Cilenti fica menos gritante quando da entrada em cena de Cillian Murphy e Michael Smiley, e nenhum dos quatro está excepcionalmente bem.

Há uma visível evolução no instante em que Justine, a única mulher da história, e Ord, um galã meio ensebado, surgem meio de contrabando, com a licença do trocadilho, e os apresentam ao chefe da malta, um certo Vernon; esse segundo núcleo, com Brie Larson e Armie Hammer em intensidades diametralmente opostas, mas complementares, acaba por se constituir o fio condutor do roteiro de Wheatley e Amy Jump, costurando os personagens de Riley e Cilenti ao gângster abilolado vivido por Sharlto Copley, num papel essencialmente pleno de nuanças, mas que nunca vai além do que cabe na superfície.

A gangue de Vernon, composta por Martin, Harry e Gordon, de Babou Ceesay, Jack Reynor e Noah Taylor, igualmente não é capaz de contornar o previsível e, na virada do primeiro para o segundo ato, momento em que os bandidos começam a bater cabeça entre si, a narrativa sobe mesmo de temperatura; a questão é que o texto engessado não permite nenhum grande evento de última hora, e, assim, o diretor não consegue elaborar uma solução que explique a constatação de haver tantos caciques numa mesma tribo, cada um querendo mandar mais e, claro, tirar mais vantagem sobre o outro.

A fotografia talvez seja o grande equívoco de “Free Fire: O Tiroteio”, deixando pesado o que se vê na tela, sem chegar perto dos noires de onde saíram belezas pelas mãos de Otto Preminger (1905-1986) e Robert Siodmark (1900-1973), por exemplo. Um pouco mais de luz ajudaria, mas não seria o bastante para evitar o massacre de Wheatley.


Filme: Free Fire: O Tiroteio
Direção: Ben Wheatley
Ano: 2016
Gêneros: Ação/Comédia/Policial 
Nota: 7/10