Romance encantador que acaba de estrear na Netflix vai fazer você esquecer todos os problemas da semana Divulgação / Netflix e Super Channel

Romance encantador que acaba de estrear na Netflix vai fazer você esquecer todos os problemas da semana

O Natal tem um gosto todo próprio. Há quem espere o ano inteiro para cometer seus pecadilhos culinários, e para isso muita gente precisa trabalhar duro, abdicando de seu tempo para fazer a alegria dos outros. Kerrie Murphy é uma dessas incansáveis operárias das celebrações alheias, chegando à noite mais esperada dos últimos doze meses tão exaurida que não se atreve a pensar em nada além de banho quente e uma cama onde se jogar sem remorso.

A protagonista de “Doce Amor de Inverno” parece já ter vivido todos os sonhos, e agora se dá por satisfeita em permanecer no comando do negócio que mantém com seu irmão, até que também isso vai ganhando uma nova roupagem, à qual ela tem de se ajustar rápido. Em seu sétimo trabalho sobre paixões inesperadas, desencontros, venturas e promessas de felicidade eterna que tomam forma na vida de gente comum nos últimos dias antes da Noite Feliz, durante a estação do frio no hemisfério norte, T.W. Peacocke remexe velhos conceitos sobre o que vem a ser entregar-se a um sentimento do qual poucos escapam, por mais combalidos que estejam. Ainda que o Natal não surja em todas as suas cores e brilho aqui, o diretor transforma o roteiro de Cara J. Russell num belo tributo à magia natalina.  

A Murphy’s faz o Natal mais doce desde 1948, e Kerrie está à frente da loja há pelo menos quatro décadas, ajudando os avós e os pais na administração e, o principal, na cozinha. Peacocke explora todos os elementos cênicos que pode, de miniaturas de torres e árvores de Natal a imensas fôrmas banhadas em chocolate belga e biscoitos coloridos em vitrines sedutoras, para isolar sua personagem central nesse universo, como se sua vida estivesse mesmo completa. Ainda no prólogo, desaba sobre ela a notícia de que Jake, o irmão e sócio vivido por Darrin Baker, pretende desfazer a parceria porque a esposa vai deixar Hollybrook, cidadezinha num ponto qualquer do coração da América — ainda que as gravações remontem a North Bay, em Ontário, centro-leste do Canadá —, e vai trabalhar em Londres, e ele pretende acompanhá-la. Jake já tem um comprador para a sua parte na empresa e quer convencer a irmã a aceitar o substituto, Brooks McLeod, em desafeto dos tempos de escola.

O espectador é tomado de um primeiro golpe de constrangimento ao se dar conta de que a história é só isso, e nesse termos: um caso malresolvido de cinquentões que tornam a se encontrar numa quadra um tanto acerba da vida, meio a contragosto e remoendo arcaicíssimas mágoas de séculos, mas Lori Loughlin e James Tupper fazem-no com tal convicção que é impossível não lhes dar crédito. Loughlin, voltando de um hiato compulsório ao termo de dois meses de cadeia pela participação na fraude que garantiu a suas duas filhas ingresso na Universidade do Sul da Califórnia, guarda esse travo de melancolia que cai feito uma luva para Kerrie.

Tupper, por seu turno, passa longe do galã de outrora — e esse é um ingrediente fundamental para a parceria com a colega seja o mais orgânica possível. Depois de alguns estranhamentos de parte a parte, os dois se acertam, mas numa reviravolta manjada (e bem-conduzida), Peacocke quase separa os pombinhos para sempre, só para outra vez, com o socorro do adorável Papa Joe de Allan Royal, fazer com que voltem às boas. Tudo o que espíritos de chumbo querem ganhar do Bom Velhinho. 


Filme: Doce Amor de Inverno 
Direção: T.W. Peacocke
Ano: 2023
Gêneros: Comédia/Romance 
Nota: 8/10