Ignore a crítica e assista: filme com Jake Gyllenhaal e Ryan Reynolds, na Netflix, te agarra e não te deixa respirar Divulgação / Sony Pictures

Ignore a crítica e assista: filme com Jake Gyllenhaal e Ryan Reynolds, na Netflix, te agarra e não te deixa respirar

Filmes que, de uma forma ou de outra, tratam do homem, sua interação com o ambiente e as consequências mais deletérias desse fenômeno — o apocalipse, no pior cenário — já se tornaram o clichê por excelência do cinema mundial. Parece que diretores de todas as colorações ideológicas, professando fés as mais variadas ou fé nenhuma, com visões de mundo mesmo incoerentes com o ofício de que tiram o sustento são, de tempos em tempos, acometidos de uma descrença fundamental do existir, um incômodo que acaba por redundar em trabalhos escatológicos em todos os sentidos. “Vida” é mais um desses filmes, contornando aqui e ali lugares-comuns para resvalar em outras armadilhas muito próprias do gênero.

Dono de um currículo admirável, o chileno-sueco Daniel Espinosa faz bom proveito de tudo quanto foi absorvendo ao longo de duas décadas como diretor, e em “Vida” faz um apanhado de algumas das boas histórias que contam de seres mais ou menos autônomos firmes em sua saga de desafiar a superioridade do homem, num cenário cujos mistérios nunca haveremos de desvendar de todo. Os invasores somos nós e a vantagem é deles.

O roteiro de Espinosa, Paul Wernick e Rhett Reese coloca seis astronautas de diferentes nacionalidades numa estação espacial internacional com o curioso nome de Pilgrim 7, e eles parecem mesmo peregrinos em busca de redenção, como se expiassem os pecados da humanidade inteira. Truques de câmera aliados à fotografia sempre lúgubre de Seamus McGarvey dão a ideia de um imenso edifício revestido de espelhos, aqueles que tomaram os horizontes das metrópoles planeta afora, flutuando no breu infinito.

Rory Adams fora o eleito para sair do módulo e recolher amostras do solo de Marte, e essa parece ser a única função de Ryan Reynolds. Quando volta, depois de quase ser atropelado por um pedaço de fuselagem que se solta de outro dispositivo — esse decerto é um sinal de que alguma coisa de muito errado haveria de acontecer, diriam os supersticiosos —, entrega o material a Hugh Derry, o biólogo molecular de Ariyon Bakare, que sente menos a ação da gravidade por ser paraplégico. Miranda North, a comandante vivida por Rebecca Ferguson, observa tudo sem ter toda a liberdade de que gostaria para intervir, enquanto David Jordan, de Jake Gyllenhaal, segue as instruções de Derry, aumentando a temperatura de 120 graus abaixo de zero para vinte graus positivos, e oferecendo uma solução de glicose para ver se o organismo unicelular que encontraram é capaz de se desenvolver. E ele reage, afinal.

Ninguém está excepcionalmente bem em cena além de Calvin, o marciano, batizada assim pelos estudantes americanos que venceram um concurso nacional e homenagearam sua escola emprestando-lhe o nome para a criatura. A destreza de Espinosa na condução do enredo, todavia, enche os olhos, e ninguém jamais para checar o andamento do cronometro. Como sabemos todos os que apreciam essas narrativas, todas descendentes em alguma linhagem de “2001 — Uma Odisseia no Espaço” (1968), de Stanley Kubrick (1928-1999), a sorte da tripulação não demora a virar e Calvin, algo entre uma serpente anabolizada e uma orquídea furiosa, torna-se o senhor da vida naquele cubículo de lata flutuando pelo universo, até que os bravos conseguem acionar a cápsula de fuga e cair numa praia do Japão. Não deu para entender por que “Vida” não teve uma continuação, mas foi melhor assim. Calvin talvez fosse o único a discordar. 


Filme: Vida
Direção: Daniel Espinosa 
Ano: 2017
Gêneros: Ficção científica/Terror 
Nota: 8/10