Cativante e encantador, filme que acaba de chegar na Netflix vai renovar sua fé na vida e na humanidade Divulgação / Netflix

Cativante e encantador, filme que acaba de chegar na Netflix vai renovar sua fé na vida e na humanidade

Se governos intervêm nas raras ocasiões em que ricaços passam sufoco, pobres aguentam como podem na hora em que o barco começa a fazer água, tendo de se contentar com a solidariedade uns dos outros. Uma crise financeira levou à ruína de milhares de instituições voltadas à especulação e ao empréstimo de somas vultosas, bilhões de dólares liquefeitos da noite para o dia, e, claro, naufragaram junto uma infinidade de micro, pequenas e médias empresas, e quem consegue honrar suas dívidas já se dá por satisfeito. David Fishwick, dono de uma rede de concessionárias de vans comerciais em Burnley, cidadezinha no noroeste do Reino Unido, só não teve de fechar as portas porque sacou da manga uma ideia tão arriscada quanto brilhante, e é por assim que “David Contra os Bancos” vai ganhando a simpatia do público.

Chris Foggin não faz uma localização exata de seu filme no tempo, mas fica claro que muito do enredo remonta a 2008, quando da inesquecível falência do tradicional banco de investimento americano Lehman Brothers, então com mais de 150 anos de existência. Século e meio é justamente o intervalo, rompido por Fishwick, desde a última permissão para a abertura de uma casa de crédito na Inglaterra, desafio que ele nunca pensou ser de todo impossível de superar. O problema foi avançar depois de findas as negociações, uma guerra de nervos entre ele e um batalhão de advogados diligentes, todos interessados em estrangular a iniciativa do empreendedor.

Decerto o que mais chama a atenção em Dave é seu jeito despachado, em nada correspondente ao que se espera de grande capitalista, e tanto menos de um banqueiro convencional. Na sequência de abertura, Dave aparece confraternizando com outros moradores de Burnley no Duck and Drake, um pub numa rua tranquila do subúrbio. Numa mesa, ele bebe com a esposa, Nicola, de Jo Hartley, e alguns amigos até ser convencido a subir ao palco e entoar os versos de canções do Def Leppard, sua banda favorita, Free e Whitesnake.

Rory Kinnear não descuida um instante da postura relaxada de seu herói, definitivamente um britânico nada comum, e o roteiro de Piers Ashworth vai a pouco e pouco destacando o temperamento nada acomodado do povo de Burnley, sempre disposto a pensar em soluções para os vários impedimentos do dia a dia, colocando-os em prática o quanto antes. Para que seus negócios não parassem, ele chegou a emprestar dinheiro do próprio bolso aos clientes, e por incrível que pareça, nunca recebeu um calote. Necessidades a exemplo de uma rede de saúde mais bem-equipada, com mais profissionais e sem que se precise recorrer a planos de saúde para um atendimento mais rápido, inspiram Fishwick a ampliar a ideia dos favores monetários a seus compradores sob a forma de um pequeno banco, momento em que o engravatado Hugh desembarca em Burnley.

Muito do encanto do filme deve-se à parceria inusitada de Kinnear e Joel Fry, o representante jurídico do Conselho de Regulamentação Financeira inglês. A princípio rivais, Fishwick e Hugh acabam encontrando um no outro aquilo que lhes falta, amizade que se estreita ainda mais com o caso do personagem de Fry e Alexandra, a sobrinha do protagonista, vivida com a graça habitual por Phoebe Dynevor. Conto sobre um capitalismo meio romântico, “David Contra os Bancos” chega a surpreender pela convicção com que tudo é dito, algo muito conveniente em tempos de incerteza, vitimismo e miséria em cada esquina.


Filme: David Contra os Bancos
Direção: Chris Foggin
Ano: 2023
Gêneros: Comédia/Drama/Biografia
Nota: 8/10