Inspirado em Agatha Christie e Alfred Hitchcock, filme que acaba de estrear na Netflix vai te transformar em um detetive Divulgação / Netflix

Inspirado em Agatha Christie e Alfred Hitchcock, filme que acaba de estrear na Netflix vai te transformar em um detetive

A vida sem a única preocupação de aproveitar as piscinas aquecidas de casas portentosas, cercadas de jardins exuberantes e câmeras de segurança atentas a qualquer movimentação estranha pode ser a morte para muita gente. Dar-se conta de que essa existência de fausto, de jantares finos ao menos uma vez por semana, de mordomo, cabeleireiro, motorista, assessores, capachos, está definitivamente encerrada, e que a partir de agora, a rotina passa a um entra e sai de contadores e advogados, catalogando tudo, coleções de arte, roupas de grife, perfumes importados, joias, carros de luxo, imóveis, para satisfazer credores já um tanto furiosos é pior jeito de se adiar a morte para pessoas como Olivia Uriarte, a misteriosa personagem central de “Mate-me, se Puder”.

Olivia nasce da pena de Carmen Posadas, uma das mais conhecidas escritoras de língua hispano-americana do mundo hoje, e essa premissa, a de uma dondoca sem norte (e arruinada) quando do término do quinto casamento, por incrível que pareça, sustenta todo o mistério no filme do mexicano José Manuel Cravioto, um diretor ainda jovem e já bastante prolífico que se sai especialmente bem em narrativas de suspense. “Invitación a um Asesinato”, o romance policial de Posadas, de 2010, é adaptado por Cravioto, com a participação da autora, além de Anton Goenechea e Javier Durán Pérez, de modo a conservar o sutil nonsense que define o livro, uma crítica quase diáfana aos ricos e suas excentricidades, o que Posadas já fizera em “Hoy Caviar, Mañana Sardinas” (2008).

Para contar a história de Olivia, Cravioto abre uma grande margem a fim de descrever Ágatha, o eixo em torno do qual “Mate-me, se Puder” gira. A meia-irmã da protagonista, vinte anos mais nova, tem abre o enredo gravando um podcast sobre tramas violentas e inexplicáveis da crônica policial, alertando que mistérios só podem ser desvendados se se prestar atenção a todos os vários detalhes que se escondem sob arranjos irretocáveis à primeira vista. “Crimes 

Não Resolvidos” é um sucesso, mormente entre leitores de, claro, Agatha Christie (1890-1976), Arthur Conan Doyle (1859-1930) e Alfred Hitchcock (1899-1980)”, e a audiência fiel, demanda sacrifícios. A propósito da Dama do Crime, é impossível não estabelecer a conexão entre o longa e “Entre Facas e Segredos” (2019), onde Rian Johnson junta num mesmo ambiente todos os suspeitos de um homicídio bárbaro — e, em assim sendo, como um fio puxa outro, chega-se a “O Assassinato no Expresso Oriente”, publicado por Christie em 1934. Muito antes disso, contudo, a narrativa se desloca para Los Cabos, balneário na extremidade sul da península de Baja California, cidade para a qual Ágatha se desloca a convite de Olivia, que surge em flashbacks ligeiros, colocados bissextamente, depois de ser encontrada morta no dia anterior. Em Los Cabos, a atormentada meia-irmã encontra os oito personagens que, por uma razão ou outra, tinham suas justificativas para desferir o último golpe.

Maribel Verdú e Regina Blandón se alternam na condução do enredo, que vai se tornando muito mais cômico do que o usual para um suspense. Depois de mirar sete suspeitos, a revelação do verdadeiro culpado, num cenário que em nada remete às agruras do fim da existência, e o expediente de que se lançou mão para tal, comprova: grã-finos podem ser de um invejável pragmatismo em assuntos bastante complexos.


Filme: Mate-me, se Puder
Direção: José Manuel Cravioto
Ano: 2023
Gêneros: Comédia/Mistério/Suspense
Nota: 8/10