Com Ethan Hawke e John Travolta, tesouro do faroeste que poucos conhecem está na Netflix Divulgação / Blumhouse Productions

Com Ethan Hawke e John Travolta, tesouro do faroeste que poucos conhecem está na Netflix

Na sequência de abertura de “Terra Violenta”, um forasteiro cruza o deserto rumo a alguma parte no território mexicano quando se depara com um padre implorando por ajuda, uma vez que sua égua não se move, esgotada pelo calor. O homem apeia do cavalo, troca umas palavras com o religioso, oferece um minuto de atenção e consolo enquanto tenta entender o que se passa, e é surpreendido pelo ataque do missionário, que saca da pistola e exige que o estranho ceda-lhe sua alimária.

Essa crítica nada sutil aos falsos profetas que grassam nos tempos de dificuldade rompe o filme de Ti West, um western que amalgama o melhor de Sergio Leone (1929-1989), Don Siegel (1912-1991) e Quentin Tarantino sem abrir mão de suas próprias concepções sobre o que tenha sido viver num inóspito pedaço de chão, sem lei e quase sem esperança, onde o darwinismo social nunca cede e os mais fortes subjugam os mais débeis (e a polícia, e quiçá a própria natureza) até que estejam todos devidamente paralisados de medo. Em seu roteiro, West parte de um gasto clichê para elaborar cenas primorosas, vitaminadas pela ótima trilha de Jeff Grace, e uma coadjuvante que captura os olhares e salva o anti-herói já de imediato.

“Terra Violenta” não se leva a sério, e essa é sua maior qualidade. Depois de se livrar do farsante vivido por Burn Gorman em participações bissextas, mas cada vez melhores, o cavaleiro misterioso que tem o filme em sua garupa chega a Denton, um povoado no Texas, no centro-sul americano, e encontra o horror de anos de descaso e selvageria que se seguiram à Corrida do Ouro, que empurrou os homens jovens para a Califórnia em meados do século 19, entre 1848 e 1853.

Embora o diretor-roteirista não defina ao certo quando se passa a história, mas a relação de um sujeito endurecido pelas tantas batalhas perdidas consigo mesmo é o argumento atemporal de que West serve-se para convencer o público de que Paul, o caubói de Ethan Hawke, tem boas intenções. Nesse aspecto, o longa tem alguns pontos de contato com “Ataque dos Cães” (2022), a bela adaptação de Jane Campion para a novela “The Power of the Dog” (1967), de Thomas Savage (1915-2003), da qual também sai a imagem do cachorro como parceiro incondicional do homem em sua insana jornada pela Terra.

A cadela Abbie, da espertíssima Jumpy, é a única criatura sábia o bastante para absorver os anseios de Paul, e no momento em que sai da trama, faz mais falta que o Marechal interpretado por John Travolta, ótimo, encarnando a um só tempo o caos e a barbárie, ou Mary-Anne, a mocinha sonhadora de Taissa Farmiga. Essa mistura de crueza e lirismo, humor e sangue, deixa em quem assiste em gosto de quero mais. Todos gostamos do desafio do absurdo às vezes.


Filme: Terra Violenta
Direção: Ti West
Ano: 2016
Gêneros: Faroeste/Ação
Nota: 9/10