Último dia para assistir na Netflix a obra-prima de Rod Lurie, que é considerada uma sessão de tortura cinematográfica Divulgação / GEM Entertainment

Último dia para assistir na Netflix a obra-prima de Rod Lurie, que é considerada uma sessão de tortura cinematográfica

O gênero humano conseguiu evitar sua extinção ou, na melhor das hipóteses, a estagnação evolutiva, graças à habilidade de compartilhar conhecimento. Informações sobre as necessidades mais triviais, como o melhor local da floresta para caçar sem enfrentar a perigosa concorrência de lobos e ursos, ou que determinadas plantas belas poderiam ser venenosas, foram cruciais para estabelecer um domínio que já dura mais de trezentos mil anos, no caso do Homo sapiens. Foi a supremacia intelectual sobre os demais animais que permitiu ao ser humano conquistar o planeta, mas sem a evolução da força física, esse avanço teria sido inútil.

 O ser humano precisou dominar, primeiro, os animais que julgava mansos, para que trabalhassem a seu favor; em seguida, ao perceber que não poderia confiar na generosidade das feras que também dependiam da carne de outros animais para crescer, desenvolver-se e alimentar seus filhotes, e que eram muito mais fortes e vorazes, precisou encontrar maneiras de superar essa desvantagem física e combatê-las. Nesse processo, surgiram ferramentas e armas como facas, lanças, fundas e machadinhas, e quanto mais pensava, mais ampliava seus domínios, pois além da terra, tornou-se sábio o suficiente para desvendar os segredos do fogo.

Séculos depois, no século 9 da era cristã, foi descoberto que misturando carvão, salitre e enxofre em proporções adequadas, criava-se um composto explosivo que mudaria o destino da humanidade. Passaram-se mais quatro séculos até que a pólvora fosse incorporada ao arsenal bélico, tornando a guerra um elemento central na política, com seus sons e cheiros inconfundíveis jamais abandonando os horizontes.

Declarar guerra, mesmo com extrema cautela, tornou-se cada vez mais uma possibilidade concreta, e hoje, no terceiro milênio, parece que o ser humano desenvolveu um fascínio pelo cheiro da pólvora queimada e o som do aço dos canhões, preferindo a força física às negociações diplomáticas, muitas vezes iniciando conflitos sangrentos por mal-entendidos que poderiam ser evitados com uma simples conversa. A guerra exerce um estranho fascínio.

Rod Lurie é um dos diretores que melhor compreendeu o potencial narrativo da guerra, capaz de cativar enquanto descreve a trajetória da humanidade. “Posto de Combate” (2020) tem a intensidade dramática e o impacto visual de clássicos modernos do gênero, como “Guerra ao Terror” (2008), dirigido por Kathryn Bigelow; “Falcão Negro em Perigo” (2001), de Ridley Scott; ou “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), de Steven Spielberg, inserindo o espectador no centro da ação.

A habilidade de Lurie para desenvolver uma boa história se alia aos talentos emergentes de uma nova geração de atores que conhecem as batalhas internacionais apenas de ouvir falar, mas que captam perfeitamente a direção pretendida pelo cineasta, sem deixar de seguir sua própria intuição. Caleb Landry Jones, Milo Gibson e Scott Eastwood destacam-se especialmente, sendo interessante notar que os dois últimos são filhos de estrelas consagradas em produções que exploram a natureza humana, Mel Gibson e Clint Eastwood, respectivamente.

Eastwood, em particular, apresenta uma performance notavelmente superior à sua atuação em “Instinto Assassino” (2022), de David Hackl, sugerindo que ele deveria investir mais em papéis que lhe são confortáveis, como fez seu pai no início da carreira, para ganhar experiência e, então, alçar voos mais altos.

O roteiro de Paul Tamasy e Eric Johnson não traz grandes inovações ao abordar um episódio específico da ocupação americana no Afeganistão: um ataque de dois dias, em outubro de 2009, a uma base avançada em Kamdesh, no nordeste do país. Localizada no centro de um vale, a instalação sempre foi alvo de controvérsia, e à medida que a história avança, fica claro os erros progressivos na cadeia de comando.

Após oito anos desde os ataques ao World Trade Center e ao Pentágono, em 11 de setembro de 2001, quando as tropas americanas foram enviadas ao Afeganistão, houve dez baixas em Kamdesh. A guerra no Afeganistão só terminou oficialmente doze anos depois, em 30 de agosto de 2021. A ocupação custou mais de dois trilhões de dólares e resultou na morte de cerca de 2.300 militares americanos, com uma média de trinta anos de idade.


Filme: Posto de Combate
Direção: Rod Lurie
Ano: 2020
Gêneros: Guerra/Drama
Nota: 9/10