Personagens cativantes em narrativas onde carros poderosos desempenham um papel crucial são fundamentais. Um jovem deslocado, afetado por uma leve perda auditiva, poderia justificar suas escolhas questionáveis nesse contexto. Baby, o foco de “Em Ritmo de Fuga”, escolhe o caminho do crime, encarando sua situação como um revés do destino, sem atribuir culpa a outrem. É um jovem que comete delitos, mas sofre de problemas auditivos.
Baby pode não reconhecer isso como um mecanismo de defesa do cérebro para lidar com traumas severos, que o jogaram nesse mundo de silêncio forçado; porém, Edgar Wright, o diretor, caracteriza o anti-herói com um charme rebelde que consegue tocar corações endurecidos. Para isso, contou com a presença cativante de Ansel Elgort, que com habilidade e carisma, torna crível a faceta de um jovem de aparência inocente, ocultando um interior profundamente atormentado. A química entre Elgort e Wright é evidente sempre que Baby aparece em cena, a qual, eventualmente, é enriquecida pela entrada de Lily James na trama, tornando a dinâmica do relacionamento central algo impossível de ignorar.
Talvez influenciado por suas experiências traumáticas, Baby desenvolveu uma habilidade excepcional para dirigir sob pressão — e todas as situações são desafiadoras em sua profissão como motorista de fuga para uma equipe de ladrões liderada por Doc, interpretado por Kevin Spacey. Doc é o estrategista que informa seus comparsas dos planos antes de despachá-los com Baby, cujo talento brilha mesmo enquanto escuta música incessantemente para silenciar o zumbido em seus ouvidos, um resquício do acidente que transformou sua vida. Para Baby, a existência é ditada pela velocidade, mas é a música de seus iPods que orienta suas ações diárias e seu modo de trabalhar, permitindo-lhe escapar, mesmo que momentaneamente, de sua realidade e desventura, conferindo a “Em Ritmo de Fuga” uma essência única, quase como um musical onde as melodias são fundamentais.
Desde o início, a equipe de Doc inicia um assalto a um banco, deixando Baby no carro ao som de “Bellbottoms”, de Jon Spencer Blues Explosion, imerso na música sem o uso de fones. A tensão aumenta quando Buddy (Jon Hamm), Darling (Eiza Gonzalez) e Griff (Jon Bernthal) retornam, carregados de dinheiro, e o filme assume um ritmo frenético. As sequências de perseguição, meticulosamente dirigidas por Wright, destacam-se como algumas das mais memoráveis do cinema contemporâneo. Wright, sem esquecer o elemento musical, concebe o enredo e a trilha sonora como um conjunto unificado, com Baby carregando o peso de fazer o público acreditar em sua realidade permeada por música.
Assim como os videoclipes de outrora, “Em Ritmo de Fuga” sugere que a música tem um papel preponderante, mas a escolha de Wright de focar no aspecto rítmico não compromete a solidez da trama. A ação é o ponto alto, mantendo-se consistente até uma reviravolta surpreendente que conclui a jornada de Baby e Debora. Enquanto o desfecho não chega, Baby é forçado a continuar como o condutor nas missões cada vez mais audaciosas de Doc, devido a uma dívida pendente com o criminoso. Lily James, como Debora, reinsere a possibilidade de uma vida ordinária para Baby, apesar de simples e mal remunerada, desde que acompanhada pelo amor. Como é típico nesse gênero de filme, uma vez que se desvia do caminho, é impossível retornar ao antigo modo de vida. No entanto, Debora oferece a Baby a chance de corrigir seu percurso, embora isso pareça mais um desejo do que uma realidade palpável.
É natural colocar “Em Ritmo de Fuga” lado a lado com outras obras semelhantes. “Drive” (2011), dirigido por Nicolas Winding Refn, parece ter sido uma fonte de inspiração para Wright, desde a construção do protagonista até a gestão de suas
Filme: Em Ritmo de Fuga
Direção: Edgar Wright
Ano: 2017
Gênero: Ação/Romance
Nota: 9/10