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O grande problema da violência psicológica, é que ela não só é difícil de identificar, como também é de denunciar. Afinal, como se proteger de uma pessoa que não deixa rastros concretos dos danos e prejuízos que causa? “Querida Alice” é um filme sobre três amigas de infância, Alice (Anna Kendrick), Sophie (Wunmi Mosaku) e Tess (Kaniehtiio Horn), que tiram uma semana de folga em uma cabana à beira de um lago. Ao longo dos dias, a convivência entre elas traz à tona lembranças e mágoas, mas principalmente um segredo: Alice é vítima de violência doméstica.

Para conseguir viajar com as amigas, Alice precisou mentir para o namorado, o artista plástico Simon (Charlie Carrick). Controlador, narcisista e chantagista, ele consegue manipular as emoções da jovem por meio da autoestima. Alice sofre cada vez mais com crises de ansiedade, transtornos obsessivos (como arrancar os cabelos), sente que Simon consegue ler seus pensamentos e o vê em sua mente, a todo momento, julgando suas ações, mesmo quando ele não está por perto. Simon também a obriga a manter relações sexuais com ele, mesmo quando Alice não quer.

Embora ela não revele os detalhes de sua relação para as amigas, aos poucos elas percebem, no comportamento de Alice, que algo não está certo. Quando ela finalmente se abre sobre sua convivência com Simon, o diálogo entre as amigas flui melhor, como se uma pedra tivesse sido retirada do caminho.

“Querida Alice” é um suspense psicológico, porque o espectador experimenta com a protagonista a angústia e o terror de ser atormentado por alguém que, mesmo quando está longe, te faz se sentir observado.

Em uma cena, Tess lê um trecho de Virginia Woolf: “Ela se sentia muito jovem, ao mesmo tempo, inconcebivelmente velha. Passava por tudo com uma faca afiada; ao mesmo tempo, ficava de fora, contemplando.  Tinha uma sensação permanente, olhando os táxis, de estar longe, longe, bem longe no mar e sozinha; sempre era invadida por essa sensação de que era muito perigoso viver, ainda que por um dia”. Assim como as palavras da autora britânica traduzem muito bem o sentimento de Alice, o filme dirigido por Mary Nighy e escrito por Alanna Francis e Mark Van de Vem também expressam de forma muito sutil e ao mesmo tempo profunda a sensação de alguém que passa por uma situação como a de Alice.

Uma história de outra mulher se cruza com a de Alice no filme, que é a da adolescente desaparecida Andrea Evans, que mobiliza a população da pequena cidade, que organiza buscas nas matas por ela. Embora o filme termine com o caso sem solução, o desaparecimento da garota captura a atenção de Alice. Há algo de semelhante entre elas, ambas estão perdidas. À deriva, em algum lugar. Elas precisam ser encontradas, mas, por alguma razão, elas não têm como pedir por ajuda.

Há algumas pontas que nunca são amarradas. A casa abandonada que Alice explora e corre após ser afugentada por um morcego, o batom encontrado da grama dessa mesma casa. Afinal, o que esse lugar representa em todo o contexto? O que o filme tem a ganhar com estas cenas? Nunca fica claro.

Carrick exerce muito bem seu papel intimidador como Simon, assim como Kendrick convence bastante ao se transformar em uma mulher frágil e até infantil, depois de ter seu psicológico destruído por seu companheiro.

Apesar dos pequenos furos no roteiro, esse filme consegue mostrar muito bem como relacionamentos abusivos tem efeitos devastadores. Mas também consegue expressar de forma muito bela, natural e potente a aliança entre mulheres.


Filme: Querida Alice
Direção: Mary Nighy
Ano: 2022
Gênero: Suspense / Drama
Nota: 8/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.