O meu tipo de mulher lava, passa e sonha em dar o fora

O meu tipo de mulher lava, passa e sonha em dar o fora

O meu tipo de mulher é de matar. Que o digam as estatísticas: 4,8 assassinatos para cada 100 mil mulheres, de acordo com a OMS. O meu tipo de mulher lava, passa e sonha em dar o fora. Ela não apenas cozinha, como apanha do marido, vira estatística e deixa o arroz queimar. “La mujer latina es más caliente.” Eu gosto de raspa de arroz na panela de ferro, mas, machismo é duro de engolir. O meu tipo de mulher vai se candidatar a vereadora no próximo pleito. Ela pariu de cócoras, cagou no assoalho, seus filhos merdinhas cresceram, as tetas caíram, mesmo assim, dispensou o períneo e um consórcio entre amigas para colocar silicone no peito.

O meu tipo de mulher faz supermercado, passeata, aborto clandestino e morre de septicemia. Para piorar as coisas, na opinião dos especialistas em excomungados, vai parar direto no inferno. Tenho uma linha direta com Deus, acredite. Ele me disse que a vida é que é um inferno; os homens, uma legião de demônios. O meu tipo de mulher ganha mixaria. Ela faz faxina, sexo casual e, de uns tempos pra cá, ficou meio besta, cheia de vontades, prefere não ficar por baixo, mas, sentar-se por cima; ainda consegue tempo para ter orgasmos e fazer um doutorado. O meu tipo de mulher opera na bolsa e no Souza Aguiar, no Rio. Ela rema contra a correnteza: todo santo dia, essa santa leva os filhos de canoa pra serem alfabetizados numa escola ribeirinha. Ah… Todas as lágrimas de mulher correm para o mar. Homem, não; homem não chora.

O meu tipo de mulher não se alinha, pois, pensa em se separar do marido ou vender uma bicicleta. Ela pedala pelada pelo Parque Ibirapuera, sem apoiar as mãos no guidão, a coisa mais linda desse mundo. Leva flores nos cabelos, pinta no corpo, com letras garrafais, que é uma criatura livre, embora não seja. O choro, sim, é livre. Que seja. Aliás, o meu tipo de mulher desaba e chora por vários motivos: o leite que azedou, o clima que azedou, a menstruação que chega carregada de azedume, choro fácil e muita melancolia. Eu bem que tento, mas, o meu tipo de mulher é difícil de entender, nem chocolate resolve. Ela vem com o manual de convívio a dois escrito em aramaico, sem chance. O meu tipo de mulher faz desmanche: quebra corações, destrói casamentos, arrasa quarteirões; ela simplesmente causa estragos quando o assunto é romance. Ela faz papai-e-mamãe, transa sem camisinha e, quase sempre, sem ter vontade. Na verdade, o meu tipo de mulher se prostitui na Augusta pra defender um trampo.

Calma lá. Tenha paciência. Meu cérebro de bosta só pega no tranco. O meu tipo de mulher não é de parar o trânsito, mas, dirige uma empresa. Paga a conta, conta piada, pede demissão, poda a grama, toma cerveja, manda alguém ir tomar no olho do cu; eu, por exemplo. Já faz tempo, o meu tipo de mulher não recebe um assovio, uma cantada, uma buzina que seja. Os operários da obra já não param de assentar tijolos por causa dela. Ficou gorda, velha e ótima, como todo mundo fica um dia, a não ser que morra atropelado ou com a porra de um tiro. Até as balas perdidas me rejeitam. Por que, Meu Pai? O cachorrinho desse tipo de mulher que ficou madura não tem mais um número de telefone para dar. Nem precisa. Quase ninguém liga. Mas, eu me importo, pode apostar. Se isso não ficou claro é porque você é que entendeu tudo errado. Releia, por obséquio.