Eberth Vêncio

Vem ni mim, esbórnia Foto / Joa Souza

Vem ni mim, esbórnia

O carnaval não gosta de mim. E já faz muito tempo. Desde a minha meninice. Meu pai me levava, juntamente com os meus irmãos, para as matinês carnavalescas do clube dos funcionários do Banco do Brasil, que ele adorava. Ele adorava o clube, o banco; não as matinês. O desgosto pela folia, portanto, devia ser coisa de família. Meu velho sentia uma gratidão eterna por aquela instituição financeira. Algo de idolatria mesmo, de cunho quase transcendental, eu diria. Papai foi de uma época em que se remuneravam muito bem os funcionários do banco.

Humano, ridículo e limitado

Humano, ridículo e limitado

Eu era um idiota. No duro. Não usava nem perto dos tais 10% da minha cabeça animal, como cantava Raul Seixas. Nas décadas de 1970 e de 1980, poucos sabiam o que significava a palavra bullying. Ninguém usava esse termo no Brasil. Aliás, estudar inglês era um verdadeiro pé no saco. Bullying era um vernáculo desconhecido, ainda mais quando se vivia no interior do país, uma região culturalmente atrasada, cuja economia era eminentemente agropastoril.

Como é que vou dizer para a minha mãe que eu a amo?

Como é que vou dizer para a minha mãe que eu a amo?

O centro da cidade sempre reservava surpresas aos transeuntes. Um cara vendendo um rim. Um renal crônico a mendigar no semáforo. Um viciado a pedir um fósforo. Rastros de bosta humana no passeio público. Seres humanos particulares. Um casal de caramelos engatado pelas genitálias. Um pastor com os sovacos suados. Um cossaco a praticar malabares. Lugares inusitados que serviam iguarias incríveis, como era o caso da Lanchonete da Tia Nair.

Morrer é buscar a bola no fundo do gol e nunca mais voltar

Morrer é buscar a bola no fundo do gol e nunca mais voltar

Prefiro chamar de metas os meus sonhos. Arre! Acabo de meter os pés pelas mãos. Metas não. O termo metas remonta ao mundo empresarial corporativo. Um escândalo. Vou denominá-los objetivos. Assim fica mais adequado. Ainda que não me reste grande coisa. Eu suponho. Sonho é um substantivo que soa por demais fantasioso, longínquo, nada factível. Algo como dividir o palco com Paul McCartney ou tomar um sorvete com Scarlett Johansson. Por mais que se queira, não vai rolar.

Felicidade ainda que tardia

Felicidade ainda que tardia

Susie estranhou a si mesma. Sentia uma alegria desgraçada — no sentido bom, hiperbólico — desde as primeiras horas da manhã. E olha que o dia estava terrivelmente propício para a prática da neurastenia: o céu cinzento, feioso, quase ninguém nas ruas e uma chuva torrencial que parecia querer penetrar nos ossos. Aos 25, em certa medida, Susie pensava e agia como se tivesse 65. Pelo andar da carruagem, sua alma acabaria sucumbindo mais cedo do que o corpo.