Adaptação de livro que vendeu 15 milhões de exemplares, aventura na Netflix vai melhorar seu fim de semana Reda Laaroussi / Netflix

Adaptação de livro que vendeu 15 milhões de exemplares, aventura na Netflix vai melhorar seu fim de semana

Refazer a vida pode se tornar um desafio para verdadeiros heróis, especialmente quando não se consegue abandonar os velhos ambientes onde se viu nascer todos os vícios que também passaram a integrar uma natureza resistente. Uma quadrilha de tipos heterogêneos, mas coesa, volta à ativa inspirada por motivos particulares e humanísticos em “O Salário do Medo”, a releitura de Julien Leclercq para o clássico de mesmo nome dirigido por Henri-Georges Clouzot (1907-1977) a partir do livro de Georges Arnaud (1917-1987) e lançado em 1953.

Leclercq reinventa a história de quatro homens em desespero, um caminhão sucateado e uma carga de galões de nitroglicerina com uma ligeira concessão ao politicamente correto ao incluir uma mulher na nova configuração do longa de Clouzot, estrelado por Yves Montand (1921-1991), Peter van Eyck(1913-1969), Charles Vanel (1892-1989) e Folco Lulli (1912-1970).

Nota-se na versão de sete décadas atrás elementos ainda hoje arrojados, a exemplo dos ângulos ora claustrofóbicos, ora feitos de permissiva amplitude, efeito que Leclercq imita com competência, tendo, claro, a tecnologia por grande aliada. Ousadias que tais garantiram a Clouzot a Palma de Ouro em Cannes, o Urso de Ouro em Berlim e o BAFTA de Melhor Filme, concedido pela Academia Britânica de Cinema, sucesso tão estrondoso que o diretor continuou a ser reverenciado.

Outras duas adaptações saíram de “O Salário do Medo” original — “Violent Road” (1958), de Howard W. Koch (1916-2001); “O Comboio do Medo” (1977), de William Friedkin (1935-2023); “Ice Road” (2021), levado à tela por Jonathan Hensleigh; além de um episódio da lendária “Profissão: Perigo” (1985-1991), a série de TV transmitida pela ABC e replicada para o mundo todo; e da oficina de Christopher Nolan para o elenco de “Dunkirk” (2017), mirando particularmente as sequências levadas nos domínios da carroceria —; quanto à produção chefiada por Leclercq, o desempenho irregular do elenco compromete em boa medida o resultado definitivo.

Num país indeterminado, mas violento, uma usina solar continua a produzir nitroglicerina para que o refino de petróleo seja mais célere. Um acidente numa das plataformas exige a interferência do bando dos irmãos vividos por Alban Lenoir e Franck Gastambide, que vão se juntar aos mercenários de Ana Girardot e SofianeZermani. A opção de Leclercq e do corroteirista Hamid Hlioua quanto a omitir os nomes dos personagens imprime uma aura de irremediável perdição àqueles infelizes, mas confunde o público em alguns momentos, como também desembarca na trama a esposa do irmão interpretado por Lenoir, em busca do marido depois de um episódio passado no deserto.

Embora um tanto absorto nos pensamentos pseudoexistencialistas que fazem-no a refletir sobre o porquê de estar ali, o tipo a que Lenoir dá vida é, aliás, quem se presta a levar a narrativa, unindo os outros membros da equipe. O diretor faz uso de um flashback e volta nove meses no tempo, tentando elucidar lances obscuros de cada uma daquelas pessoas nebulosas, mas perde a grande oportunidade de deslindar o episódio da orfandade de Girardot e a traição de Zermani, justamente os dois atores que menos conseguem dizer o que fazem ali.


Filme: O Salário do Medo
Direção: Julien Leclercq
Ano: 2024
Gênero: Ação/Aventura/Drama
Nota: 7/10