Indicado ao Bafta, romance épico inesquecível com Kate Winslet, na Netflix Divulgação / BBC Films

Indicado ao Bafta, romance épico inesquecível com Kate Winslet, na Netflix

Nem toda biografia é fácil de ser escrita e quanto mais distante no tempo ela está de nós, mais complexo se torna desnudar os acontecimentos por trás de uma vida. Algumas figuras históricas podem ter suas jornadas retratadas com maior facilidade devido a documentos, diários, cartas e testemunhas que deixaram para trás provas e vestígios. Este não é o caso de Mary Anning, paleontóloga e caçadora de fósseis inglesa da era vitoriana. Em “Ammonite”, o cineasta Francis Lee utiliza recursos literários para dar sua versão da história.

No filme, Kate Winslet é Mary Anning, uma mulher que se destaca no cenário científico por suas descobertas que influenciaram e impactaram o mundo acadêmico. Os estudos de Mary Anning chegaram a influenciar até mesmo Charles Darwin em sua teoria evolucionista. Apesar de tamanha relevância, ela foi excluída da comunidade científica do século XIX por ser mulher. O filme de Lee a retrata exatamente como a inspiração que era, mas como mesmo assim ela foi relegada a uma vida pobre. Apesar de suas enormes contribuições, jamais foi elegível para se associar à Sociedade Geológica de Londres. Também não era creditada por vários trabalhos importantes.

Mary Anning jamais se casou. E justamente pelas enormes injustiças sofridas por conta de seu gênero, o cineasta Francis Lee, que queria oferecer junto com o recorte da biografia de Mary Anning um romance, optou por criar um relacionamento amoroso fictício entre ela e Charlotte Murchison (Saoirse Ronan). A amizade entre elas existiu. Charlotte foi esposa de Roderick Murchison e o acompanhou em diversas escavações. Também se tornou amiga íntima de Mary Anning, com quem caçava fósseis.

No enredo, Roderick é um homem egoísta que abandona Charlotte para se recuperar de um esgotamento físico e mental na costa onde Mary Anning mora e a pede para cuidar de sua esposa, enquanto ele viaja a trabalho. Aos poucos, essa amizade entre as duas mulheres é delineada e se desenvolve para um romance explosivo.

Mary vive com a mãe e é graças ao seu trabalho de caçar e vender fósseis que elas sobrevivem. Tanto Mary quanto Charlotte são mulheres solitárias rejeitadas por uma sociedade machista que constantemente as exclui. O amor entre elas flui a partir deste sentimento de encontrar uma na outra o acolhimento e a compreensão que não encontram lá fora, mas é importante destacar que tudo isso é criação da mente de Francis Lee, que considerou injusto dar à sua Mary Anning um romance com um homem, levando em consideração tudo que ela passou durante sua vida.

Apesar deste olhar solitário e até silencioso, já que “Ammonite” utiliza poucos diálogos e é, em grande parte, um filme mais de imagens e contemplações, a história que se conhece da vida de Mary Anning é que ela tinha muitos amigos e era bastante acolhida e respeitada, tanto que quando descobriu estar com câncer, aos 47 anos, seus amigos e boa parte da comunidade geológica de Londres juntou fundos para financiar seu tratamento.

“Ammonite”, na Netflix, se destaca pela fotografia deslumbrante e fria de Stéphane Fontaine. Com uma abordagem naturalista e paleta gelada, a fotografia destaca as paisagens costeiras, dando uma sensação de afastamento social, ao mesmo tempo em que cria, a partir deste isolamento, um ambiente íntimo para as duas protagonistas.


Filme: Ammonite
Direção: Francis Lee
Ano: 2020
Gênero: Biografia/Drama/Romance
Nota: 8/10