O melhor filme de 2024 até agora é um espetáculo cinematográfico

O melhor filme de 2024 até agora é um espetáculo cinematográfico

Denis Villeneuve parece ter a meta de superar-se a cada trabalho. Imbuído de oxigenar “Duna”, o enredo de ficção científica da série de Frank Herbert (1920-1986), publicada entre 1965 e 1985, logo um cult também no cinema, Villeneuve tratou de ignorar as saborosas doidices que David Lynch colocou em marcha na primeira transposição dos livros de Herbert para a tela grande, em 1984, e “Duna: Parte Um” (2021) é um espetáculo de luz e som com o melhor que a tecnologia deste insano século 21 pode oferecer.

“Duna: Parte Dois”, a nova empreitada do diretor pela saga de um jovem monarca decaído em meio a uma acelerada metamorfose física e espiritual, reforça tudo quanto há de estranhamente belo no longa de três anos atrás, com a vantagem de poder exigir tudo de seu protagonista, maduro o bastante para convencer o público de que Paul Atreides é mesmo o homem certo na hora certa. Quase todo o roteiro, de Villeneuve e Jon Spaihts, gira em torno da força e das muitas vulnerabilidades de Paul, que encontra lugar em sua alma ingênua e benevolente para acomodar o gosto por disputas e justiça num tempo em que barbárie campeia. Sua espada vira, afinal, uma extensão de seu corpo, e Timothée Chalamet se alterna entre performances eminentemente braçais e sequências em que refina sua sensibilidade, marca de uma carreira mais e mais sólida, a fim de dominar também essa natureza de seu personagem. O resultado é nada menos que estarrecedor.

O espectador é outra vez despejado outra vez em Arrakis, planeta de atmosfera vermelha que lembra Marte, e cuja única riqueza são as especiarias, diligentemente guardadas por vermes titânicos que viram feras ao menor barulho. A população de Arrakis é subjugada por bárbaros que extraem todo o quinhão que podem desses recursos, sem que nunca herói nenhum jamais se levante contra eles. Até que surge Paul, que se atribui o papel de messias de Arrakis e se insurge contra os déspotas que usurpam seu povo, os Fremen.

O diretor volta a “Duna: Parte Um”, mostrando o funeral de Jamis, o guru anabolizado da tribo adversária interpretado por Babs Olusanmokun, derrotado numa peleja cruenta de que Paul sai vencedor. A primeira grande reviravolta é que o filho de Leto Atreides assume o lugar do rival morto, para surpresa de sua mãe Jessica. Assim como Chalamet, Rebecca Ferguson revela facetas inéditas da outrora soberana de Arrakis, e os dois passam a experimentar uma vida nômade e de privações, somando estoicismo a práticas místicas, gancho de que Villeneuve se serve para relembrar a importância ainda maior das especiarias, substâncias mágicas que aguçam a percepção, guardadas pelos imensos vermes subterrâneos que se insurgem contra os ocupantes da superfície quando se incomodam com o barulho.

No terceiro ato, “Duna: Parte Dois” se reconecta à pena de Herbert, sacando das provocações de seu criador. A fotografia de Greig Fraser, que ganhou o Oscar de Melhor Fotografia pelos laranjas ferruginosos do céu de Arrakis, impressiona também pelas cenas em preto e branco de uma batalha em arena encabeçadas pelo vilão Feyd-Rautha, com Austin Butler surpreendentemente asqueroso, e muito melhor que Javier Bardem, canastrão na pele do escorregadio Stilgar. Aqui, Paul Atreides fica ainda mais certo de que sua vida vai piorar um tanto, o que Villeneuve reserva para “Duna: Parte Três”.


Filme: Duna: Parte Dois
Direção: Denis Villeneuve 
Ano: 2024
Gêneros: Ficção científica/Aventura/Drama 
Nota: 9/10