Últimos dias para assistir à obra-prima de Pedro Almodóvar que pouquíssimas pessoas conhecem, na Netflix Manolo Pavón / El Deseo

Últimos dias para assistir à obra-prima de Pedro Almodóvar que pouquíssimas pessoas conhecem, na Netflix

O vasto e precioso legado cinematográfico do renomado diretor espanhol Pedro Almodóvar é frequentemente iluminado por verdadeiras pérolas, e entre elas, “Julieta” se destaca como uma joia muitas vezes negligenciada. Este intrigante filme, lançado em 2016, não recebeu o devido reconhecimento na época, principalmente devido a questões extracurriculares que envolveram o nome de Almodóvar no infame escândalo do Panama Papers, um redemoinho de corrupção e evasão fiscal. O nível de envolvimento do diretor e seu irmão, Augustín, permanece até hoje como um enigma não totalmente decifrado. Independentemente das controvérsias que possam pairar sobre sua vida pessoal, é inegável que poucos artistas contemporâneos conseguem ostentar a autenticidade e ousadia presentes em sua obra.

Iniciado sob o título original de “Silêncio” e um roteiro redigido em inglês, “Julieta” experimentou uma reviravolta notável em seu desenvolvimento. Almodóvar hesitou em conduzir sua obra para território estadunidense, uma terra desconhecida onde a barreira linguística se apresentava como um desafio significativo. Adicionalmente, a coincidência temporal com o lançamento de “Silêncio”, dirigido por Martin Scorsese, influenciou a decisão de renomear o projeto. Julieta, o nome da protagonista interpretada por Emma Suárez e Adriana Ugarte em diferentes fases de sua vida, emerge como o epicentro deste drama envolvente que desenrola-se em diversas linhas temporais.

Num passado distante, Julieta, personificada por Ugarte, é uma jovem professora de literatura que cruza o caminho do encantador pescador Xoan, interpretado por Daniel Grao, durante uma viagem de trem. O fogo da paixão entre eles a leva a abandonar sua cidade e carreira para viver com Xoan numa serena vila litorânea. Nesse novo lar, ela estabelece uma conexão com Ava, uma artista plástica interpretada por Inma Cuesta, que se torna sua confidente e melhor amiga. No entanto, essa amizade é abalada quando Julieta descobre o relacionamento secreto de Xoan com Ava, um segredo mantido longe dos olhos de Antía, a filha do casal, interpretada por Priscilla Delgado e Blanca Parés.

A tragédia se abate sobre a vida de Julieta quando Xoan desaparece num acidente de barco durante uma crise conjugal. A viúva lida com a dor da perda e encontra apoio em sua filha adolescente, Antía, e em sua amiga Bea, interpretada por Michelle Jenner. Ao longo dos anos, Julieta dedica-se à sua filha, mas quando Antía completa 18 anos, parte para um retiro espiritual, iniciando um enigma que desafia a própria lógica.

A habilidade singular de Almodóvar em explorar a psique feminina é um traço distintivo em toda a sua carreira. Suas protagonistas, mulheres comuns, transmitem uma autenticidade que as aproxima das mulheres em nossas vidas, seja como mães, tias ou vizinhas. Seu estilo visual inconfundível se revela no uso audacioso de cores vibrantes, especialmente o vermelho, e nas alusões a obras de artistas renomados, como a marcante semelhança do roupão de Julieta com a icônica pintura “O Beijo” de Gustav Klimt.

A narrativa de Almodóvar é rica em complexidade, povoada por personagens e reviravoltas cativantes, transformando seus filmes em experiências que parecem ultrapassar o tempo de projeção real. Cada personagem é um universo autônomo, pronto para ser explorado, e “Julieta”, na Netflix, ocupa uma posição destacada na lista de suas obras-primas. Este é um testemunho da genialidade do cineasta e de sua habilidade incomparável em contar histórias que ecoam as vidas e experiências das pessoas comuns.


Filme: Julieta
Direção: Pedro Almodóvar
Ano: 2016
Gênero: Drama / Romance / Mistério
Nota: 9/10