Última oportunidade do ano para se fazer merda

Última oportunidade do ano para se fazer merda

(dedicado a Gilberto Mendonça Teles)

Anda! Me ama! Me alimenta! Me enlaça! A graça está mesmo no ingresso das línguas pelos vincos das palavras. Engraçado: apesar de tudo, sinto-me triste. Livros. Trago-te livros. Larvas. Escuto larvas que se movimentam na tessitura cadavérica da lavra de um poeta que fui. “La mer! La mer!”. A merda do francês que nunca aprendi antes de morrer na praia. Trago-te também a minha mais completa ignorância, o mórbido vapor do cigarro que torna o meu beijo ainda mais saburroso.

Tive um dia horroroso. Fui trucidado por excessos de realidade. Sinto-me esgotado. Não sei mais sobre que assunto escrever, musa adorável. Bebo horrores no balcão de uma birosca. Sou reconhecido pelos meus pares, como o vate maldito que hoje rejeita a si mesmo. “Do jeito que tu bebes, mandrião, tornar-te-ás enfim um imortal”, brinca um acadêmico de priscas eras, um memorialista viciados em horas, em heras, em lamúrias; um escriba maconhado de qualidade literária superior, inconteste, igualmente embriagado, fatuamente aprisionado à coleira da lira.

Delirante, em meio ao furdunço de bêbados, bobocas e raparigas, rabisco versos satânicos nos espaços em branco do maço de cigarros. “Se for para morrer de câncer, que seja com classe”, reflito resignado, entontecido como uma piorra, ao passo em que trago do pito a fumaça maligna. Trago-te a velha verve, diletíssima amiga. Trago-te a paixão em mim entranhada, impensada e, quiçá, o simulacro de um amor com o qual possas te divertir. Lê, adorável flor. Seja como for, lê o inédito poema que te dedico enquanto depilas as tuas virilhas noviças numa breve pausa de conquistar os homens e as mulheres desse mundo.

O meu coração é pequeno, do tamanho da bola 7 que o malandro encaçapa na mesa de bilhar desse antro imundo. Dão-lhe com um taco no topo do crânio. Gotículas de hemácias respingam gerânios. A cena é dantesca. Melhor não olhar agora, suave gazela. A paixão me sorri como a hiena que cobiça a carniça de um amor que já morreu. Escrevo. Ainda escrevo. Comovidíssimo. Casado com a dor em meio à balbúrdia protagonizada por machos etilizados. Lê, amantíssima. Lê, por piedade de mim, pelo fim da procela dessa paixão que, feito um cancro, me dilacera.

Eu tive uma ideia incrível. Pensei que tu possas gostar. Cruzar a nado esse rio. Nadar de costas no mar. Tomei gastura do tempo. De tanto no tempo pensar. Pensei é chegado o momento. De afogar as tolas mágoas num bar. Afago os teus cabelos crespos. Crispo os lábios afoitos por beijar. Decrépitos os meus medos se extinguem. Sopesam poder levitar. Espero que nossos corpos se confundam. Se é amor, amizade ou ficar. Finco a estaca no monte de Vênus. Do teu corpo leitoso a gozar. Gozemos o lado bom dessa vida. Na terra, na água ou no ar. Se um dia a dor nos alcança. Feito uma lança suspensa a voar. Voemos enquanto nos resta algum tempo. De ver aonde essa história vai dar.