Como escrever um livro campeão de vendas

Como escrever um livro campeão de vendas

Um dos mistérios no mercado cultural é a criação de uma obra (livro, filme, disco) que tenha grande aceitação de público e, consequentemente, renda alto volume de vendas. Foi pensando nesse enigma permanente que os pesquisadores Jodie Archer e Matthews L. Jockers fizeram um experimento com inteligência artificial de computadores: descobrir a anatomia dos livros que chegaram nos últimos 30 anos ao topo da lista de mais vendidos, elaborada pelo jornal “The New York Times”.

O resultado do levantamento está no livro “O Segredo do Best-Seller” (2017), já traduzido e publicado no Brasil. A lógica de investigação seguiu o modelo de big data para encontrar padrões de texto e identificar conteúdos recorrentes. É o mesmo procedimento de análise de dados, usado para detectar sentimentos em postagens nas redes sociais. Com isso, os autores desenvolveram um software capaz de ler romances e apontar suas características comuns, como gênero dos personagens e local da trama.

“Os programas, algoritmos e códigos que escrevemos para esse estudo foram elaborados para processar livros e extrair informações detalhadas sobre o estilo único de cada um, assim como seus temas, seus altos e baixos emocionais, seus personagens e ambientes, junto com todo tipo de dado linguístico aparentemente mundano que não se traduz facilmente em conceitos como estilo e enredo”, explicam Archer e Jockers.

O Segredo do Best-Seller, de Jodie Archer e Matthews L. Jockers (Astral Cultural, ‎ 240 páginas)

Inicialmente, o modelo separou 20 mil características textuais comuns dos best-sellers. Os pesquisadores adotaram o conceito de “aprendizagem de máquina” (machine learning) e refinaram o software para 2,8 mil itens “úteis para diferenciar entre histórias que todos parecem querer ler e os livros que tinham mais chance de se restringir a um nicho”. Em A partir disso, criou-se uma escala de 0 a 100 para ver quais obras tinham mais traços em comum e, logicamente, carregavam maior potencial de público.

O objetivo de tudo era ter um programa de computador que identificasse um manuscrito inédito e mostrasse se ele se encaixava ou não no grupo dos blockbusters literários das últimas três décadas. Segundo Archer e Jockers, o nível de acerto foi de 80%. Ou seja, o romance “O Código Da Vinci” foi colocado na máquina como se fosse uma obra jamais publicada. No final das contas, o software apontou as seguintes obras que têm a maior quantidade de elementos de um best-seller dos últimos 30 anos: 

O Círculo, de Dave Eggers

Um Mundo à Parte, de Jodi Picoult

Cadê Você, Bernadette, de Marie Semple

The Burning Room, de Michael Connelly

The Hit, de David Baldacci

Scarpetta, de Patricia Cornwell

Seis Anos Depois, de Harlan Corben

Dupla Cilada para Cross, de James Patterson

Twelve Sharp, de Janet Evanovich

Em Defesa de Jacob, de William Landay 

O que esses livros têm em comum que atraem tanto público? Primeiramente, é preciso dizer que os consumidores de ficção nos Estados Unidos são as mulheres. Resultado: em quase 100% dos best-sellers, o personagem principal é uma mulher. E mais curioso, é uma protagonista feminina com personalidade sombria e indecifrável a princípio. Não se sabe ao certo, mas muitas das protagonistas têm 28 anos de idade, notam Archer e Jockers. Os leitores esperam que as histórias terminem com um casal unido e feliz.

Os temas mais explorados no best-seller são tecnologia (21%), relações de trabalho (4%) e proximidade humana (3%). Questões tecnológicas abrem espaço para discussões sempre atuais de vigilância digital, fim da privacidade, crimes, conspirações — tudo que também faz parte do universo explorado pelo cinema de Hollywood. Um thriller que envolve temas científicos tem maior chance de vendas, portanto — sem esquecer que ele deve preferencialmente ser protagonizado por uma mulher.

A pesquisa de Archer e Jockers também estabeleceu os padrões usados por escritores e escritoras. Há uma maneira própria em cada gênero. O estilo “masculino” é usado majoritariamente por homens que têm formação acadêmica tradicional, com mestrado ou doutorado. Trata-se de um típico professor de nível superior que decidiu escrever ficção. Já o “feminino” reúne autoras com experiência profissional em jornalismo e publicidade, sinalizando para um entendimento mais próximo das preferências dos leitores.