Segredos protegem existências, mas ninguém permanece indiferente diante de uma vida construída em torno de mistérios. A sabedoria popular prega a prudência sobre o que revelar e para quem, mas há segredos que emergem das profundezas de uma forma incontrolável, revelando mais do que se gostaria. Essa tensão entre ocultar e expor compõe o cerne de “O Lugar da Esperança”, um drama que ora surpreende com sua dureza realista, ora expõe de maneira farsesca uma chaga social que parece irremediável, perpetuada em diversas esferas da sociedade.
Phyllida Lloyd, de maneira cuidadosa, porém firme, aborda a transcendência e a luta por algo que é, ao mesmo tempo, essencial e constantemente negado. Os obstáculos para se alcançar esse objetivo se acumulam, como se fossem barreiras invisíveis, extenuantes, que testam a resiliência, provocando dor, frustração, e ao mesmo tempo oferecem uma possibilidade de redenção, mesmo que tardia. Sua direção enfatiza o jogo de luzes e sombras, espelhando o dualismo presente nas vidas dos personagens, alternando entre o belo e o trágico.
Numa tarde abafada, duas meninas brincam sob o sol, com suas silhuetas contrastando com a claridade, uma escolha que já sugere algo significativo. Minutos depois, uma delas decide maquiar a mãe, em uma cena aparentemente trivial, mas repleta de tensão. O ambiente de calma enganadora é interrompido quando Emma, a mais nova, faz perguntas sobre a mancha de nascença de sua mãe, Sandra. Ela responde com uma metáfora divina, um detalhe que se tornará a última interação leve antes do caos.
Gary, marido de Sandra, logo entra em cena, questionando a origem do dinheiro escondido no carro, o que desencadeia uma onda de violência chocante. O abuso, ainda que apenas insinuado, deixa claro o terror daquela casa. Sandra, prevendo o perigo, havia instruído Emma a buscar ajuda em código, mas já era tarde. A brutalidade daquele momento marca o início de uma jornada sombria e de autodescoberta.
Clare Dunne, Ruby Rose O’Hara e Ian Lloyd Anderson dão vida a essa narrativa de desintegração familiar, alimentada pelo flagelo da violência doméstica. Lloyd concentra sua atenção no verdadeiro cerne do filme à medida que a protagonista luta para encontrar um lugar seguro e esperançoso, mesmo que, no fim, o que ela aprenda seja a dolorosa verdade de que algumas pessoas simplesmente não têm nada para oferecer.
Filme: O Lugar da Esperança
Direção: Phyllida Lloyd
Ano: 2020
Gêneros: Drama/Thriller
Nota: 8/10