Desde os primórdios, a humanidade expressa sua angústia em encontrar entre os comuns, indivíduos que transcendam a condição humana, revestindo-se de uma mística sobrenatural, capazes de navegar pelo território da utopia e dos sonhos. Os anos se acumulam como peças de um brinquedo de montar, encaixando-se de forma orgânica, mas à medida que o tempo passa, as diferenças de cores, texturas, formas e composições se tornam evidentes, apontando para a conclusão de que a existência é inerentemente heterogênea. O comportamento humano oscila conforme as circunstâncias, sendo de responsabilidade exclusiva dos indivíduos a condução das questões que os atormentarão ao longo da vida.
O ser humano está sempre em busca de uma luz, mesmo que difusa, que o guie à sabedoria instintiva necessária para alcançar o autoconhecimento. Este autoconhecimento é o alicerce para construir fortalezas que protejam sua alma das vicissitudes do mundo. Este estágio inicial, lento e doloroso, é apenas um preparo para algo mais significativo: a autoafirmação.
O sentimento de fracasso é extremamente corrosivo para o espírito humano. Desistir de um desafio, por mais justificável que seja a razão, soa como covardia, o oposto do que a vida representa. Nesses momentos de fraqueza, é a consciência de nossos propósitos vitais que nos salva, orientada por figuras inspiradoras que, como cometas, cruzam o firmamento da existência humana de tempos em tempos.
Ao longo de quatro décadas de carreira, Nicolas Cage incorporou uma aura que combina bom-mocismo com a violência que seu semblante doce dissimula tão bem. Poucos atores personificariam com tanta intensidade o propósito de Johnny Martin em “Uma História de Vingança. O título original, “Vengeance: A Love Story”, junta a ideia de reparação ao intuito de contar uma história de amor, sentimento que surge em John Dromoor, o detetive interpretado por Cage, e que oscila entre duas mulheres, mãe e filha, que entram em sua vida de maneiras diversas e complementares.
O roteiro de John Mankiewicz destaca o lado nobre do protagonista, relegando suas tragédias pessoais a um plano secundário, reveladas gradualmente a partir do segundo ato, quando Dromoor se envolve com Teena Maguire, interpretada por Anna Hutchison, vítima do crime que sustenta o enredo, e com Bethie, a filha de doze anos, interpretada por Tabitha Bateman, que testemunha tudo.
O texto de Mankiewicz é fiel ao romance de Joyce Carol Oates, publicado em 2003, no qual o filme se baseia, ao mesmo tempo em que resgata elementos significativos da trajetória de Cage no cinema, como em “Olhos de Serpente” (1998), de Brian De Palma. O roteirista e o diretor são hábeis em extrair da narrativa de Oates aspectos que no livro ficam obscurecidos.
A entrada em cena de Don Johnson como Jay Kirkpatrick, advogado que defende os agressores de Teena, traz à tona discussões sobre ética no meio jurídico, sendo um dos pontos altos da trama, que se revela sofisticada e cínica, mas de um cinismo romântico, característico de Nicolas Cage.
Filme: Uma História de Vingança
Direção: Johnny Martin
Ano: 2017
Gêneros: Ação/Thriller
Nota: 8/10