Comédia romântica europeia que acaba de estrear na Netflix é um dos filmes mais divertidos de 2024 Anne Wilk / Netflix

Comédia romântica europeia que acaba de estrear na Netflix é um dos filmes mais divertidos de 2024

Há algum tempo, a medicina descobriu que a mágoa por relacionamentos fracassados converte-se mesmo numa dor da carne. Com sintomas parecidos aos do infarto, o que inclui dor no peito, falta de ar ou cansaço, a Síndrome de Takotsubo, também conhecida por Síndrome do Coração Partido, é rara, mas ocorre em momentos de estresse intolerável, o que, por óbvio, tem reflexos na para além da saude emocional do paciente, que acaba inspirando o cuidado de uma junta de profissionais, até que se convença de que precisa rever suas atitudes.

O protagonista de “Agência do Amor” é um homem patologicamente amargurado, recém-saído de um namoro melancólico que afinal soçobrara depois de um tempo de desacordos e agressões. Shirel Peleg, venezuelana radicada em Israel, situa seu filme na Alemanha, adaptando as situações propostas pela escritora Elena-Katharina Sohn em seu livro homônimo de modo a fazer da história a alegoria quase poética sobre o grande risco de se apaixonar. O texto de Sohn, Antonia Rothe-Liermann e Malte Welding frisa a tristeza paralisante desse homem, mas vai dando à audiência pistas que levam-na a esperar pelo desfecho menos sombrio, depois de um sofrimento evitável.

Como se incompatível ao estar do homem no mundo, a própria felicidade se nos apresenta como um dos tantos perigos do existir. Presa dos mecanismos de repressão e autocensura dos quais nunca consegue ver-se livre; tentando contornar a dureza do real valendo-se do poder salvífico e intangível da fé; colocando à prova seus limites e seu empenho em tornar reais as mudanças, óbvias ou profundas, de que se considera merecedor; sempre flertando com a tragédia, à espreita, calada e sedutora, nas curvas mais sinuadas do caminho; equilibrando-se sobre o delicado fio que aparta o caos do inferno: essa dicotomia invencível da alma humana, mediada pelas circunstâncias inexplicáveis que fazem com que tudo pareça o delírio imanente que paira sobre a existência de cada um em maior ou menor grau, cura ou envenena a depender da forma como é absorvida.

Logo nas primeiras cenas, Peleg decupa o aziúme algo misterioso de Karl, um jornalista especializado em comportamento que há quase um ano remói o fim de uma relação que decerto já dava sinais de não estar bem das pernas. Pouco antes de sumir para sempre de suas vistas, a garota lhe confidenciara que o estava deixando em atenção a um conselho da terapeuta, a dona de uma certa The Heartbreak Agency, que dá nome ao filme em sua versão internacionalmente mais conhecida.

Valendo-se do excelente faro de repórter — que também começa a perder, tamanha sua letargia —, Karl chega até a mulher, definindo a virada para o segundo ato, instante em que, maldisfarçando a nova aversão a mulheres, o profundo desgosto de que se alimenta e, o principal, a absoluta descrença na humanidade (mormente no que toca a assuntos sentimentais), ele dá início a uma investigação contra Maria, a pessoa que arruinou sua história, pensa ele.  

Laurence Rupp e Rosalie Thomass protagonizam um estimulante jogo de gato e rato, nascido do arremedo de entrevista em que Karl distorce as palavras de Maria, além de induzi-la a declarar o que ele quer ouvir. Peleg é competente em levar a farsa por mais uma hora, fixando-se ora na aspereza do anti-herói de Rupp, ora no romanticismo sincero da antimocinha de Thomass, um jeito bastante eficaz de manter o interesse do público por um enredo já contado tantas e tantas vezes.


Filme: Agência do Amor 
Direção: Shirel Peleg 
Ano: 2024
Gêneros: Comédia/Romance 
Nota: 8/10