Filmaço com Chadwick Boseman é tesouro inestimável na Netflix David Lee / Netflix

Filmaço com Chadwick Boseman é tesouro inestimável na Netflix

Dirigido por Spike Lee, “Destacamento Blood” foi lançado em 2020. Coincidência ou não, foi justamente quando explodia as manifestações por conta da morte de George Floyd, asfixiado por um policial nos Estados Unidos. O longa-metragem que mistura em seu caldeirão elementos de guerra, comédia, aventura e drama dividiu opiniões. Há muitos anos, Spike Lee faz uma campanha em defesa da história, dos direitos e da cultura negra. Nos Estados Unidos, sua obra “Faça a Coisa Certa”, da década de 1980, alavancou sua carreira e o transformou em um símbolo de resistência. Aqui, no Brasil, “Infiltrado na Klan” é sua maior referência cinematográfica para o grande público.

O filme gira em torno de quatro amigos veteranos da Guerra do Vietnã, Paul (Delroy Lindo), Otis (Clarke Peters), Eddie (Norm Lewis) e Melvin (Isiah Whitlock Jr.), que retornam ao país de seus traumas com a desculpa de buscar os restos mortais de Norm (Chadwick Boseman), um quinto companheiro que teria morrido ainda durante a guerra. Então, temos alguns flashbacks que mostram que Norm era o líder do grupo, um soldado como nenhum outro e aquele que ensinou os amigos sobre a história dos afro-americanos quando sua comunidade enfrentava uma intensa tentativa de apagamento de suas origens. “Ele era o nosso Martin Luther King e nosso Malcom X. Ele era Mohammed Ali”, afirma o quarteto sobre o falecido. 

Spike Lee usa um artifício comum de seus filmes, que é sua didática específica para narrar eventos históricos usando muitas referências documentais, filmagens, fotos antigas, manchetes de jornais, dentre outros. Lee costura críticas à Guerra do Vietnã e sobre como o governo americano usou sua população masculina negra para lutar uma guerra que não a pertencia, idealizada por brancos, enquanto dentro do próprio país, eles desprezavam e massacravam seus negros. E até aí, o Spike Lee acerta em cheio em defender sua comunidade, criticar a guerra, fazer referências sarcásticas e afiadas ao ex-presidente Donald Trump e contar a história do quinteto de amigos de forma heroica e romantizada, porque dificilmente negros são heróis de grandes produções hollywoodianas de guerra. Você conhece algum?

No desenrolar do filme, somos revelados que a aventura do quarteto não é meramente uma busca pelos restos mortais de Norm, mas uma caçada a um tesouro que eles haviam encontrado em 1971, quando um avião americano carregado de toneladas de ouro destinados a gratificar sul-vietnamitas por seu apoio na guerra caiu. Após encontrarem as barras preciosas, os amigos as esconderam no meio da selva, em um local estratégico, obstinados a retornar para recuperar o tesouro.

E é quando a história se torna mais contemporânea que Lee erra em seu enredo e é muito criticado. O cineasta retrata os vietnamitas, atualmente, não mais como os injustiçados pela sanguinária intromissão americana na guerra. Eles são seres caricatos, rancorosos e constantemente ridicularizados. Para muitos, Lee foi extremamente hipócrita em defender sua comunidade às custas de diminuir outra cultura, que já é alvo de preconceitos.

O filme pode ser divertido e interessante do ponto de vista histórico, o que não impede Spike Lee de cometer vários deslizes, como acontece em muitos de seus filmes. Um cineasta com uma experiência de tantas décadas e tão representativo, mas que ainda insistentemente comete gafes difíceis de se ignorar.

“Destacamento Blood” tem muitas referências a “Apocalypse Now”, de Francis Ford Coppola, que incluem trilha sonora e locações. É divertido brincar de descobrir onde estão essas referências escondidas. O longa de Lee é temperado com um humor muito característico de suas obras. Além disso, o empoderamento negro que ele traz em todos os seus trabalhos é necessário, revigorante e revolucionário.


Filme: Destacamento Blood
Direção: Spike Lee
Ano: 2020
Gênero: Aventura/Guerra/Drama
Nota: 9/10