Tresvarios da folia

Tresvarios da folia

Vesprando o carnaval, a viúva Cinira de Bilora já se impactava com uns dilurimentos nos bofes, por conta da algazarra que os foliões faziam em sua pacata Miraflor, som alto perturbando o sono, imoralidades diversas nos escaninhos das ruas e praças e as nojeiras de mijo, bosta e vômito que deixavam para o deleite de mosquitos e moscas, o sofrimento do olfato e a proliferação de macacoas e murrinhas. A cidadezinha vivia no costume da pachorra, as festas que aluíam o povo do lugar eram as da igreja, dos dias santos, mas o diabo do carnaval atazanava todo ano, com um magote de gente chegante de fora e os moradores se aturdiam com essas latomias.

Duma coisa desse alarido Dona Cinira gostava: ela se deleitava com os fuque-fuques dos namoradinhos de ocasião, que espiava pelas frestas das janelas. Era um bem-bom de lembranças que lhe afogueava os entremeios de prazer. Subia-lhe um fogo gostoso aquele vaievem dos namorados se acariciando e penetrando os conduítes do amor. O pau torando de som, ela sem o apetrecho do sono e masturbando os miolos e os gurgumiis da vontade, matutando lembranças de quando furunfava gostoso com o finado Bilora.

Dia seguinte, a ladainha do “atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu”, “no azul de Jezebel no céu de Calcutá, feliz constelação”, “por isso chame, chame, chame gente / e a gente se completa / enchendo de alegria / a praça e o Poeta” voltava a buzinar nas ruas, num volume de matar morcego e azucrinar o quengo das pessoas. “Esse povo parece que é surdo, ô atentação”, gritava dentro de casa, para desassossego dela e das duas irmãs com as quais dividia o teto. Rogava praga, mas o céu de Calcutá fazia ouvidos moucos, xingava alto, mas Deus e o Diabo, usufruindo da farra, ouviam era a música, mais alta ainda. Viviam ocupados demais com a folia, com a alegria e o prazer dos moços, para dar ouvidos aos praguejamentos de uma desacorçoada.

A terça de carnaval chegou chegando, arrastando uma multidão alucinada e encantada com os prazeres da folia. Ninguém parava quieto, todo mundo aluindo, querendo ou não, com o baculejo do amor, com as furupas da alegria, com os alzheimers das dívidas, a cachaça que todo mundo acha, os priquitos molhadinhos e as pirrolas azuretadas. Uma liutria medonha. Já na madrugadinha, quando a festa se arrefecia e os casais caçavam um recôndito para as lambanças da carne, os olhos de Cinira esbugalhavam-se nas frestas, voyerizando o enlevo da pegação. Sem dormir direito, ouvidos aturdidos, enquanto auscultava de olhos arregalados, a cachola vadiava enredos e Cinira sentia calafrios, formigamentos, cócegas e tremeliques. Com a mão, enquanto olhava, se deleitava em afagar as partes, caçando jeito, serpenteando, fungando e gemendo, no tempo em que uma siririca fabricava sonhos.