Não Olhe para Cima: nem meteoros conseguem extinguir os imbecis

Não Olhe para Cima: nem meteoros conseguem extinguir os imbecis

“Não Olhe Para Cima” (2001) é um filme da Netflix sobre débeis mentais poderosos cuja paranoia permite que um cometa caia na Terra e cause a extinção da humanidade. Sim, a loucura foi inspirada no mundo real. E, para ser ainda mais fiel ao hospício, salva-se apenas um pequeno grupo de canalhas: políticos e empresários que se safam pelo espaço pouco antes que o cometa liquide o restante da espécie, que deveriam proteger.

A sátira dirigida por Adam McKay é estrelada por Maryl Streep no papel de Janie Orlean, presidente dos Estados Unidos. É uma clara citação a Donald Trump, também por causa do terninho que ela usa na cor oficial do Partido Republicano. Orlean e seu filho Jason (bela atuação de Jonah Hill como chefe de gabinete da Casa Branca) são negacionistas. Quem mais se enfurece com essa oligofrenia criminosa é a dupla de cientistas Kate Dibiaski (Jenniffer Lawrence) e Randall Mindy (Leonardo DiCaprio), responsáveis pela descoberta do cometa.

Os astrônomos se desesperam porque sua tentativa de avisar a humanidade vai se tornar uma intransponível corrida de obstáculos. Ninguém os leva a sério, nem sequer os veículos de informação. A mídia não passa mais de um espetáculo anestesiado e medíocre, movido por likes e curtidas. Brie Evantee (Cate Blanchet) e Jack Bremmer (Tyler Perri) fazem a dupla de âncoras mais conveniente que existe. Ao saber que o objeto espacial tem o tamanho do Everest, Bremmer pergunta a Randall Mindy se isso pode causar “danos a uma casa”. Está preocupado em não espantar a audiência. Assim como o cometa, esta cai vertiginosamente durante a entrevista com os cientistas, em pânico. Antes deles, na bancada, Riley Bina (Ariana Grande) batera picos de engajamento em todas as plataformas sociais. Motivo: fofocas íntimas.

Está claro que a economia é o elemento determinante de nossa infeliz sorte, neste enredo de opinião pública, Ciência, política e mídia. Tanto que a presidente Orlean representa de fato os interesses de seu principal doador de campanha, Peter Isherwell (Mark Rylance), que é fabricante de celulares. Quando o cometa se torna visível a olho nu, no céu, e nem os imbecis podem mais negar o acerto das previsões científicas, Isherwell volta à cena para impedir que o objeto seja destruído. Motivo: ele contém em sua composição inúmeros minerais raros, usados na fabricação de celulares, além disso monopolizados pela China. Isherwell deseja, portanto… minerá-lo, para o horror dos cientistas!

A opinião pública é o fiel da balança, e segue uma polarização. “Olhe para cima” é o nome da campanha de esclarecimento, com o apoio de uma sensibilizada Riley Bina. Já a presidente Orlean e Isherwell criam a campanha negacionista “Olhe para baixo”, prometendo empregos com a exploração econômica do cometa Dibiaski — e não é que a opinião pública se divide? Assim, a Casa Branca resolve deixar que o bólido espacial siga em direção à Terra, para atender os interesses de um egoísta. O bilionário Isherwell se encarrega da operação, última chance para salvar 8 bilhões de terráqueos impotentes e sem qualquer influência. É claro que o diretor Adam McKay frustra os planos temerários dos negacionistas, e o Dibiaski acaba despencando inteiro no planeta.

Trágica é a moral da sátira, da qual se ri bastante. Neste quesito sobressaem Jason, que é um demente completo, e Isherwell, que é um insano bizarro. A penúltima cena, de um “bronterok” devorando a presidente dos Estados Unidos, assim que pisa em seu novo planeta, é comédia da melhor qualidade. Foi uma feliz escolha do diretor Adam McKay, haja vista a seriedade repelente do tema. Diante da oligofrenia da Casa Branca e da imprensa, o espectador sente o pânico dos cientistas, tragados pelo totalitarismo da imbecilidade. Neste mundo caótico a linguagem lógica, conceitual e articulada, representada pela razão, perdeu a capacidade de convencimento. As pessoas viram presas fáceis de manipuladores e demagogos, que as iludem com fake news.

Tomara que um cometa não esteja mesmo vindo em direção à Terra. Se neste caso (plausível!) acontecer nova confusão, como a que se criou em torno do coronavírus, a cena final de Jason Orlean saindo dos escombros será profética. A última palavra então será do filhinho débil-mental, ao celular: “Fala aí galerinha, eu sou o último homem da Terra. Deu merda, aqui!”

Hilário, mas a mensagem subliminar é pessimista: nem meteoros conseguem extinguir os imbecis. Como as baratas, eles constituem uma praga.