Ame ou odeie, mas veja esta série

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Após quase dois anos de pandemia, dificilmente todos nós passamos ilesos. Muitos foram marcados por cicatrizes, sejam sequelas da Covid-19, luto pela morte de pessoas queridas, traumas pelos meses de isolamento social, o desemprego, o medo e a incerteza sobre absolutamente tudo na vida. Quem diz que está bem pode estar compartimentando o sofrimento. Guardando em uma caixa quase inacessível da mente e tentando seguir, mas é raro que alguém não tenha sofrido pelo menos um pouco com toda a situação.

Nós, como seres instintivos, tentamos a todo momento sobreviver. Nosso corpo encontra maneiras de agir, como os primatas que no fundo somos, e a ciência explica todo tipo de comportamento, seja o daquele que pisa em outra pessoa para se salvar durante um incêndio, ou o daquele que, mesmo depois de conseguir escapar do prédio em chamas, retorna para buscar quem ainda está preso.

Em “WandaVision”, definitivamente a melhor série de herói do DisneyPlus, a protagonista, Wanda Maximoff, vivenciou uma série de traumas. Primeiro, ela teve de lidar com a perda de seus pais, em seguida, de seu irmão e, por último, do próprio marido, Vision (ou Visão). Mas Wanda não é uma pessoa comum. Ela é um exagero de nós mesmos. Se podemos fugir de situações desconfortáveis usando a imaginação, vendo um filme, lendo um livro ou criando um mundo particular em nossa mente, Wanda pode, e cria, literalmente, um universo para si. E aí entra o mundo mágico da Disney para transformar essa história um tanto quanto perturbadora em uma série (quase) de comédia.

No primeiro episódio, as cenas estão em preto e branco. Wanda e Vision vivem em uma típica vizinhança de classe média dos anos 1950, em Westview, nos Estados Unidos, usam os trajes da época e se comportam como um casal de sitcom. Situações cômicas e pastelões são mostradas aos sons de risadas do público. Mas que público? Enfim, Wanda engravida e, nos episódios que se seguem, a vida do casal imita seriados dos anos 1960, 1970, 1980 e 1990. Os filhos gêmeos de Wanda e Vision têm saltos de crescimento e eles mal conseguem acompanhar sua infância. À medida em que a história avança, eventos estranhos começam a acontecer e atrapalhar aquela fantasia quase perfeita de vida.

Contém spoilers

Não demora para que Wanda perceba que há uma força superior regendo tudo aquilo que eles estão vivendo. Logo, Wanda percebe que é ela própria. O superpoder a protagonista é alterar a realidade da maneira que deseja. Após passar por vários traumas, ela decide usar sua imaginação para escapar de seu sofrimento. A dor de seus vários lutos é grande e a vida se torna insuportável. É preciso fugir para dentro de sua fantasia. E o sonho parece tão bom que Wanda chega a se esquecer de quão superficial é tudo aquilo.

Mas aquela cidade está presa dentro do propósito da protagonista, a chamada bolha hexagonal, que mantém todos em estado de transe. Embora não consigam reagir, suas mentes clamam por socorro dentro de seus corpos. Até que ela é confrontada pela bruxa Agatha, que faz com que Wanda acesse suas memórias mais terríveis e tenha seus poderes enfraquecidos. Não é de se surpreender que Agatha acompanhou toda a trajetória da protagonista como Agnes, sua melhor amiga, vizinha e conselheira. Como uma terapeuta, ela arranca a protagonista de sua psicose.

Além de ser um prato cheio para os fãs da sequência de Vingadores, já que a série traz de volta personagens que não existem mais, os episódios testam a esperteza do espectador, implantando easter eggs e dialogando com os filmes. Apesar de obscura, a série ameniza com boas doses de comédia, ação, figurinos divertidos e atuações caricatas.

“WandaVision” nos lembra que todos temos feridas abertas e dolorosas e todos queremos fugir delas, de alguma forma. Nos mostra que até mesmo os heróis possuem traumas e fraquezas, e que é sempre necessário e essencial cuidar da nossa saúde mental.


Série: WandaVision
Direção: Matt Shakman
Ano: 2021
Gênero: Comédia
Avaliação: 8/10