Recorde mundial: novo e polêmico filme de Anthony Hopkins chega ao Top 1 global da Netflix no dia da estreia Christopher Raphael / Netflix

Recorde mundial: novo e polêmico filme de Anthony Hopkins chega ao Top 1 global da Netflix no dia da estreia

Yeshua, Muhammad, Siddharta Gautama, Vishnu. A divindade assume os contornos que nossa mente deseja: um redentor, um tirano, um sábio desapegado ou um andarilho perdido na jornada curta e árdua da existência humana. Thomas Hobbes (1588-1679), em sua obra Leviatã (1651), descreveu essa trajetória como marcada por solidão, brutalidade e sordidez. Religião e fé, embora nuances de um mesmo conceito, atravessam também o terreno do misticismo e revelam as complexas relações entre o divino e o homem. Se, como postulou Baruch Spinoza (1632-1677), a essência de Deus permeia todos os elementos do universo — vivos ou inanimados, racionais ou não —, então o Criador pode apresentar-se sob formas paradoxais: simultaneamente perfeito e materialmente frágil. Ainda assim, a humanidade parece preferir a destruição à transformação, o fim dos tempos à redenção.

É nesse contexto que “Virgem Maria” se destaca. O filme nos oferece uma perspectiva singular: a concepção de Cristo pelos olhos de uma jovem nazarena, marcada pela pobreza e pela falta de instrução, mas dotada de uma sabedoria ancestral. Ela aceita, com coragem e resignação, um destino que, embora carregado de tragédia, é revestido de nobreza. Sob a direção de D.J. Caruso, conhecido por sucessos de ação como “xXx: Reativado” (2017), a narrativa evita os clichês sentimentais e as soluções simplistas, explorando um tema onde todos sentem-se autorizados a opinar.

A religião, embora rotulada por alguns como “o ópio do povo”, tem sido o farol que guia incontáveis almas através das trevas desde tempos imemoriais, especialmente em locais desprovidos de esperança. Porém, sua natureza enigmática e imaterial gera interpretações distorcidas que precisam ser confrontadas com discernimento. Tais equívocos abrem caminho para charlatães e falsos profetas que, aproveitando-se da dúvida, desviam os ingênuos da verdadeira espiritualidade, da beleza e da graça.

Essa atmosfera de intolerância é o combustível dos ataques direcionados a Noa Cohen, a jovem israelense de 21 anos que interpreta Maria. A controvérsia sobre a fidelidade identitária do elenco ressuscita debates rasos e excludentes. No entanto, Cohen não apenas honra seu papel — ela o transcende, com uma atuação sensível e impactante. O roteirista Timothy Michael Hayes dá a ela uma base sólida para brilhar, ao introduzir a história com a jornada de Joaquim e Ana, os pais de Maria.

O casal peregrina pelo deserto em penitência até que, através do anjo Gabriel, Joaquim recebe a revelação: Ana dará à luz uma menina. Essa ligação sutil entre os nascimentos de Maria e Jesus é uma escolha narrativa que merece elogios. Anthony Hopkins entrega uma performance magistral como Herodes, um vilão que provoca repulsa e medo, mas o brilho do filme pertence a Cohen.

Caruso, ao tecer esse relato com habilidade e sensibilidade, demonstra que há espaço para sutileza e profundidade na representação de histórias sagradas. O resultado é uma obra que desafia preconceitos e convida à reflexão, provando que a fé, em suas múltiplas manifestações, permanece um campo vasto de exploração artística e humana.

Filme: Virgem Maria
Diretor: D.J. Caruso
Ano: 2024
Gênero: Drama/Épico
Avaliação: 9/10 1 1
★★★★★★★★★