Enquanto houver champanhe, há esperança

Enquanto houver champanhe, há esperança

Enquanto houver champanhe, há esperança de que exista um mundo melhor — pelo menos dentro da minha taça. Um mundo fresco, saboroso, sedutor. Quando a coisa está feia, dá-lhe champanhe! Borbulhas para brindar rimas pobres feitas de amor e dor, para transformar a normalidade em excentricidade, para enxergar beleza onde não há, para encontrar otimismo no meio de tanto derrotismo.

Enquanto houver champanhe, há esperança de que a vida não seja uma merda, mesmo que o nosso destino final seja virar merda. Ódios e rancores vão para debaixo da terra e repousarão ao lado da minha indiferença e tranquilidade. Veja bem, seremos dois adubos iguais, com a mesma serventia e nenhuma importância. Então, para que perder tempo se embostando antes da hora?

Enquanto houver champanhe, há esperança de que petistas e tucanos possam se entender um dia, de que flamenguistas e vascaínos consigam torcer sem se agredir, de que as pessoas compreendam que Deus é um só e que religiões são apenas pontos de vista. Entenderemos que somos todos seres humanos, e que apesar das diferenças, somos todos iguais.

Enquanto houver champanhe, há esperança de que a paz mundial reinará entre acordos bilionários de nações poderosas. Estes salvarão o planeta da fome, da guerra, das enfermidades, do terrorismo, do Trump e das baratas. Até porque baratas não combinam com champanhe.

Enquanto houver champanhe, há esperança de que louco mesmo seja ser normal. Deus me livre das pessoas constantes demais, dos irredutíveis que não mudam de opinião, daqueles que não alteram o tom de voz, dos que não estão dispostos a aprender e também dos que têm preguiça de ensinar. Graças ao champanhe não é possível andar em linha reta sem cambalear um pouco e rebolar um tanto. Quem tem ressaca tem mais histórias para contar do que quem bebe suco detox.

Enquanto houver champanhe, há esperança no amor, no nascimento, na reconciliação, na promoção e no tesão também. Não será mais preciso tirar os sapatos no fim da festa e calçar as sandálias da humildade, pois as festas não terão mais fim, e o cansaço não nos alcançará. Joguem fora as pílulas azuis! Deixem-se levar pelo fervor da bebida dos deuses e tudo que ela pode proporcionar. Todos os dias e noites serão regados à certeza refrescante de que a felicidade existe, sim, ao som de Marvin Gaye e seu “Let’s get it on”.

Enquanto houver champanhe, há esperança de que seremos mais corajosos e audaciosos, mais confiantes e apaixonantes, mais amorosos, mais bem-sucedidos, mais envolventes — e mais convincentes também. A felicidade existe dentro de uma garrafa, e quando fracionada em taças e absorvida em baixíssima temperatura, ela se multiplica dentro da gente. Uma súbita sensação de que o mundo é cor-de-rosa aquece o peito e as extremidades.

Enquanto houver champanhe, há esperança de aceitar que sem champanhe seremos felizes do mesmo jeito. Ou não, como diria Caetano. Um café e a conta. Por favor.

Título tomado de empréstimo da biografia de Zózimo Barroso do Amaral, de Joaquim Ferreira dos Santos