“Terapia do Prazer”, filme escrito e dirigido por Lance Young, se vende como um romance erótico. No entanto, conforme a relação entre o casal que protagoniza o filme, Joseph (Craig Sheffer) e Maria (Sheryl Lee), se desenvolve, a história vai tomando rumos surpreendentes. Lançado em 1997, distante da atual relevância que se tem hoje em discutir machismo, misoginia e violência sexual, o filme de Young se coloca na vanguarda por justamente antecipar o mote.
Há pouco mais de um quarto de século, a sociedade era muito diferente da de hoje. A internet, embora estivesse começando a penetrar no nosso cotidiano, ainda não era tão comum, difundida e democratizada. Seu acesso se limitava a uma parcela privilegiada da população. Foi graças à internet que movimentos de minoria conseguiram encontrar espaço e meio para difundir suas mensagens. Assim, o feminismo e a defesa das mulheres e crianças contra uma violência patriarcal institucionalizada, passaram a ser levados à sério. A luta não acabou, mas as coisas avançaram significativamente, especialmente a legislação e a informação sobre os temas.
O longa de Young começa quando Joseph descobre que sua esposa, Maria, está frequentando um terapeuta sexual. Possuído de ciúmes, e acreditando que o profissional mantém práticas sexuais com sua mulher, ele o confronta. Baltazar (Terence Stamp), o terapeuta, é uma figura altiva e inabalável que mora em um elegante casarão, cuja suntuosidade é encoberta pela fachada urbana de tijolinhos e a rua de comércios movimentada.
Em seu escritório atmosférico e com decoração aristocrática do século 19, Baltazar recebe seus pacientes e aceita orientar Joseph, que embora desconfiado, deseja compreender os métodos do terapeuta e pede ajuda para salvar seu casamento. O pedido de socorro de Joseph é motivado pelo desinteresse de Maria em sexo. Ela nunca teve um orgasmo na vida e se nega a deitar-se com o marido. Joseph a ama e deseja verdadeiramente compreender o que há com Maria e como curá-la para que possam viver plenamente como um casal.
Conforme os encontros entre Joseph e Baltazar ocorrem, mais ele vai compreendendo que é necessário penetrar a intimidade da esposa antes de seu corpo. É preciso entender o que faz Maria se sentir triste, angustiada e com baixa autoestima. Ele deseja encontrar a raiz de seu desinteresse sexual e descobrir maneiras de satisfazê-la, tocá-la de forma que seu corpo também sinta prazer. Ele segue os ensinamentos de Baltazar e sente que há avanços na intimidade do casal. No entanto, em uma situação em que finalmente Maria parece prestes a alcançar um orgasmo, ela tem um surto e desmaia.
Encaminhada ao médico, Maria desperta com lembranças muito vívidas de abusos perpetrados por seu próprio pai contra ela durante a infância, e que até então haviam se escondido em seu subconsciente. Revelados os traumas do passado, a relação entre ela e Joseph parece sofrer um retrocesso. Agora, ela tem em seu marido a imagem do pai abusador. Com medo de Joseph e de como se sente perto dele, Maria decide se separar do marido. Joseph, também abalado ao tomar conhecimento de todo o terror vivido pela esposa durante sua infância, precisa encontrar em seu amor um caminho e uma forma de retornar ao coração de Maria.
À princípio, me pareceu muito estranho que Young tenha tentado mesclar um romance tórrido a um drama traumático de violência sexual. Depois de digeridas as intenções do cineasta, compreendi como a situação pode ser comum em casais de verdade, e como a vida sexual está intrinsicamente conectada aos nossos traumas, experiências, autoestima, transtornos. Baltazar faz a leitura das personas de Joseph e Maria, mas o filme nos permite também olhar para dentro de nós mesmos e de nossas relações. Como quem somos e o que experimentamos em nossa história influencia nas nossas relações, não apenas as sexuais ou os casamentos, mas também nossas relações com a família, no trabalho, com amigos etc. As verdades que aprendemos a acreditar sobre nós mesmos molda a forma como lidamos com as pessoas.
“Terapia do Prazer” é um filme pesado. Não por possuir cenas de sexo e nudez explícitos, mas porque traz à tona medos, inseguranças, lembranças que podem ser dolorosas ou não, a depender de cada pessoa que assiste.
Filme: Terapia do Prazer
Direção: Lance Young
Ano: 1997
Gênero: Drama/Romance
Nota: 8/10