Luma Aiub e a vida inteira que cabe numa poesia

Luma Aiub e a vida inteira que cabe numa poesia

Caminhar por aí é um jeito bonito de estar na vida. E caminhando com as pontas dos dedos da mão, dia desses eu vi uma moça chamada Luma cantando bonito ao lado de uma violonista de nome Helena. Parei e cá estou já não sei há quanto tempo, ouvindo em repetição infantil as quatro canções do EP “Além da Lenda”, de Luma Aiub.

Pode uma poesia guardar uma vida inteira, como uma caixinha de música que abriga uma lembrança de infância? Ouvindo o canto de Luma, meu sentimento de saudade vai para lá de onde minha memória alcança. Minha vida cabe em sua poesia e eu me sinto bem.

Eu nada sei sobre ela, nada sei de sua história, sua infância, seu presente, sua gente. Não sei de onde vem a sua poesia e quem são os músicos que a acompanham. Eu só achei bonito um vídeo de Luma cantando ao lado de uma violonista de nome Helena. E senti como se elas sempre tivessem estado aqui.

A música de Luma é uma criatura da terra feito um tatu-bola, um casulo, um caramujo, uma comunidade de minhocas, uma assembleia de formigas e outros pequenos bichos elaborando belezas no silêncio do tempo.

Além da Lenda
Além da Lenda, de de Luma Aiub

Como é bonita a poesia de Luma! Simples e irrecusável. Sua graça é potência, força que derruba velhos muros e nos liberta. Arrebenta correntes, estoura grades, abre gaiolas e jaulas. Espanto que nos arranca do chão e nos lança em voo livre sobre este mundo aqui embaixo.

Fosse de vinil o álbum de Luma, seria um disquinho compacto com duas músicas de cada lado, e inda assim seria maior que toda a produção atual das grandes gravadoras multinacionais.

Cantando ao lado de Helena, Luma dá notícias de um mundo maior que tudo isso. Traz lembranças de tempos idos, perfumes de terras distantes e esperanças mais antigas que nós mesmos, sentimentos que já estavam aqui quando chegamos e aqui perdurarão até depois de quando tivermos partido.

Verdadeira e vital, sua voz é um grito profundo de nossa humanidade.

Escrevo agora em noite alta, ouvindo Luma em fones de ouvido enquanto a casa dorme. Já me encontro no estágio intermediário entre o sono e a vigília, então carece que eu lhe diga logo o que interessa, antes que tudo vire sonho e a noite engula meu juízo e todo o resto: o disco “Além da Lenda”, de Luma Aiub, que vi cantando ao lado de uma violonista de nome Helena, é das coisas mais lindas, sensíveis e potentes que encontrei caminhando por aí.