Não há nada de surpreendente em “Jogos Vorazes: A Esperança – O Final”, e isso, claro, pode ser visto sob dois ângulos, opostos e complementares entre si. Mais uma vez, cabe a Francis Lawrence dizer para onde deve caminhar a epopeia neofeminista e pseudo-revolucionária de Suzanne Collins, novamente autora do roteiro, com Danny Strong e Peter Craig, e portanto, mantém-se rigorosamente a narrativa no campo semântico em que se instalara três anos antes, no filme que inaugura a franquia, de Gary Ross. Lawrence consegue, no entanto, a proeza de ainda encontrar em seus atores o verniz de prazer que faz toda a diferença ao termo de meses de gravações que resultaram em mais de nove horas de material, que também não cansam quem seguia desde as páginas de Suzanne Collins a garota impetuosa que se rebela contra a tirania que subjuga uma população pós-apocalíptica num mundo cada vez mais caótico, no qual só sobrevive quem vai muito além de seus limites. Era perfeitamente exequível ter-se liquidado a fatura no longa de 2014, porém confirmando a tendência vista em “Crepúsculo” e “Harry Potter”, os quatro estúdios que produziram e distribuíram “A Esperança – O Final” preferiram, por evidente, fatiar o último capítulo em dois blocos monumentais, deixando o espectador cativo e, o principal, faturando em dobro. E essa não parece ser uma questão: vem aí “Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes”, sob o comando de, adivinhem, Francis Lawrence. O quinta braço da série tem estreia prevista para 15 de novembro de 2023.
Enquanto isso, Katniss Everdeen está quase sem voz diante de um Plutarch Heavensbee que se torna um aliado contra o abominável presidente Snow sem que o texto dê-se ao trabalho de se alongar em explicações. Sutilezas como essas são, contudo, a essência da trama, com Jennifer Lawrence, Philip Seymour Hoffman (1967-2014) e Donald Sutherland duelando em silêncio pela atenção do público — e três gerações de intérpretes nessa posição numa história tão absorvente quanto nonsense não é pouco. Na pele de Johanna, Jena Malone adere ao grupo oferecendo o respiro cômico que fora tão bem incorporado no filme anterior pela Effie Trinket de Elizabeth Banks, meio eclipsada pelo turbilhão de eventos que precisam acontecer em 137 minutos. Exaltar o carisma e o talento da protagonista soaria como uma avalanche de redundâncias, mas em se constatando deslizes e as tantas cenas monótonas e previsíveis, é um dever cívico. Profissional até o osso, Jennifer Lawrence assenhora-se do espírito de candidata a redentora da humanidade literalmente correndo muito para que o enredo não descarrile. O Peeta Mellark de Josh Hutcherson continua a não ajudar muito, e agora, como noivo de Katniss, sua insipidez fica ainda mais evidente. Teria sido melhor torcer um pouco o enredo original e investido o Gale de Liam Hemsworth da função de iminente cônjuge de uma heroína que nunca precisou de homem, nem de ninguém. Pode ser que o apocalipse de fato ocorra e Katniss e Peeta se casem e vivam felizes para sempre. “Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes” dirá.
Filme: Jogos Vorazes: A Esperança – O Final
Direção: Francis Lawrence
Ano: 2015
Gêneros: Ação/Ficção científica
Nota: 8/10